Natureza

Colômbia vai às urnas em meio a onda crescente de ambientalismo

O cadidato da esquerda questiona o modelo econômico e coloca o ambiente no centro do palco
<p>Candidato à presidência colombiana Gustavo Petro, em uma escola em Bogotá (image: <a href="https://www.flickr.com/photos/gustavopetrourrego/21472146530" target="_blank" rel="noopener">Gustavo Petro Urrego</a>)</p>

Candidato à presidência colombiana Gustavo Petro, em uma escola em Bogotá (image: Gustavo Petro Urrego)

Os colombianos elegerão seu próximo presidente neste domingo e, pela primeira vez em décadas, a natureza do modelo econômico extrativista do país está sendo seriamente debatida. Gustavo Petro, candidato da esquerda e ex-prefeito de Bogotá, surpreendeu os analistas ao chegar ao segundo turno com seu manifesto econômico em prol de uma “Colômbia humana”, afastando-se do petróleo e da mineração e buscando transformar o país em uma “potência agrária e agrícola”.

Isso significa que a Colômbia está prestes a se tornar menos dependente do petróleo e do carvão? Provavelmente não. Na última rodada de pesquisas eleitorais, o candidato de direita, Iván Duque, aparece em média 13 pontos percentuais à frente de Petro, que tem uma probabilidade de vitória de 20%, de acordo com o jornal diário El Tiempo. Mesmo que “dê zebra” e o ex-guerrilheiro seja eleito, qualquer tentativa de impor grandes reformas à ordem econômica liberal do país seria quase impossível, já que o congresso colombiano tem fortes tendências direitistas.

77%


dos entrevistados consideravam as questões ambientais “muito importantes” para a definição do voto

Ainda assim, a decisão de Petro de colocar as questões ambientais no centro do debate teve um efeito profundo na campanha. Em abril, a pesquisa Gran Encuesta, uma grande iniciativa envolvendo diversos veículos da mídia, revelou que 77% dos entrevistados consideravam as questões ambientais “muito importantes” para a definição do voto; o assunto ficou atrás de saúde e segurança, mas apareceu na frente de temas como impostos, o processo de paz e a reforma previdenciária.

“É a primeira vez que o debate ambiental teve um grande impacto na campanha presidencial”, disse Margarita Florez ao Diálogo Chino. Florez é diretora da ONG Ambiente y Sociedad, sediada em Bogotá. “Nos últimos anos, os ativistas ambientais têm pressionado muito por mudanças no plano nacional de desenvolvimento da Colômbia. Hoje em dia, a população exige uma maior participação no desenvolvimento dos projetos relacionados aos recursos naturais; ela vê os efeitos do planejamento ambiental negligente.”

A campanha eleitoral foi marcada por dois incidentes ambientais graves. Ao longo do mês de março, o poço Lizama, da petrolífera estatal Ecopetrol, despejou um total estimado de 550 barris de petróleo bruto em áreas importantes de captação de água perto da cidade de Barrancabermeja, no departamento de Santander, região oeste do país. A mancha oleosa produzida pelo vazamento atingiu 30 quilômetros de comprimento.

Depois disso, em maio, um defeito na barragem de Hidroituango, 175 quilômetros ao norte de Medellín, causou inundações e a consequente evacuação de 24,000 moradores nas áreas a jusante da represa. O projeto é financiado por um fundo administrado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento. O Banco Popular da China e o Banco Industrial e Comercial da China (ICBC) são entre os cofinaciadores, de acordo com a pesquisa Ambiente y Sociedad.

A cobertura dos dois desastres foi amplamente compartilhada nas mídias sociais e destacou a incompetência do estado em regular e fiscalizar grandes empresas. O fato de que as normas atuais foram insuficientes para evitar um vazamento em um poço relativamente simples e convencional como o Lizama sugere que o governo terá dificuldade em evitar incidentes similares em projetos de fraturamento hidráulico (conhecidos como fracking), que são mais complexos e profundamente impopulares.

Desde o evento, Duque – cujo avanço tem se baseado no apadrinhamento pelo ex-presidente Álvaro Uribe – parou de apoiar abertamente o fracking.

A barragem de Hidroituango foi construída durante a era Uribe, em uma área do país historicamente afetada por atividades paramilitares. Petro – um dos maiores críticos do paramilitarismo, durante seu mandato de senador oposicionista no governo Uribe – foi rápido em culpar o ex-presidente por não consultar os moradores locais antes da obra. Nisso, aproveitou para chamar atenção para seu próprio plano de aumentar a participação de projetos solares e eólicos na matriz energética da Colômbia.

Mas é improvável que isso seja suficiente para colocar Petro para dentro do palácio presidencial de Casa Nariño, e um governo Duque provavelmente significará a aceleração da atividade extrativista por meio de incentivos tributários e aumento de competitividade.

“Não podemos adotar uma política de destruição dos setores produtivos”, afirmou Duque à Reuters.“Ainda não somos um país produtor de petróleo. Somos um país com potencial. Precisamos continuar a exploração de petróleo convencional e offshore de forma a manter os fluxos de divisas que a exportação de petróleo nos proporciona.”

Isso pode ter efeitos negativos nas regiões remotas da Colômbia, de acordo com Benjamin Creutzfeldt, pós-doutorando em relações sino-latinoamericanas na John Hopkins School of Advanced International Studies. “Está claro que um governo Duque incentivaria a exportação de commodities, principalmente petróleo, carvão, ouro e óleo de palma, às custas do meio ambiente”, disse Creutzfeldt ao Diálogo Chino. “O governo central tem pouco controle sobre as áreas afastadas, onde a exploração de ouro e minerais acontece sem nenhuma fiscalização e com severos impactos ambientais.”

A Colômbia já tem uma grande dívida ambiental; nós precisamos reapropriar as antigas minas, não acelerar o modelo extrativista

Em 2016, o país atraiu US$362 milhões em investimentos estrangeiros diretos da China – principalmente no setor de petróleo, de acordo com dados do Ministério do Comércio da China (MOFCOM), cumpridos pela Red Academica China-América Latina (Red ALC-China). O número é muito menos do que o US$1,2 bilhão recebido pelo Equador e os US$760 milhões investidos no Peru, países andinos menores que a vizinha Colômbia. No entanto, nos últimos anos, empresas chinesas têm participado das licitações de grandes projetos portuários, rodoviários e de dragagem do plano de infraestrutura colombiano conhecido como 4G.

“O relacionamento da Colômbia com a Ásia Oriental é uma das menos desenvolvidas da América Latina, tanto em termos de comércio e investimentos quanto de intercâmbio cultural”, diz Creutzfeldt. “No entanto, as empresas chinesas têm sido bem-sucedidas na construção de grandes projetos de infraestrutura no Equador e no Peru, e existe um enorme potencial de desenvolvimento futuro na Colômbia.”

As empresas precisam se engajar com as comunidades para garantir benefícios tangíveis nas regiões remotas. “Os chineses desenvolveram diretrizes fortes para seus investimentos estrangeiros em mineração e infraestrutura. Esses projetos devem incluir consultas prévias e engajamento dos interessados, de forma a garantir algo além da legislação existente, que é insuficiente para garantir resultados não danosos para as gerações futuras”, diz Creutzfeldt.

A imensa escala dos investimentos previstos em mineração e infraestrutura na Colômbia já tornam quase impossível uma fiscalização eficaz pelas autoridades governamentais. “Ainda que a infraestrutura verde seja possível, o número de projetos ferroviários, rodoviários e portuários é insano, nós não temos as instituições ou a transparência necessária para gerenciar todos eles”, diz Florez.

“A Colômbia já tem uma grande dívida ambiental; nós precisamos reapropriar as antigas minas, não acelerar o modelo extrativista.”