Clima

As principais reportagens do Diálogo Chino em 2023

Do ativismo ambiental às soluções para enfrentar a crise climática, a equipe do Diálogo Chino selecionou as histórias mais marcantes deste ano
<p>Bombeiro apaga as chamas de incêndio florestal em Porto Jofre, em Mato Grosso, Brasil. Enquanto o Pantanal foi duramente atingido por incêndios este ano, a Amazônia passou por uma seca histórica (Imagem: Joédson Alves / Agência Brasil)</p>

Bombeiro apaga as chamas de incêndio florestal em Porto Jofre, em Mato Grosso, Brasil. Enquanto o Pantanal foi duramente atingido por incêndios este ano, a Amazônia passou por uma seca histórica (Imagem: Joédson Alves / Agência Brasil)

Quente, muito quente: essa pode ser a melhor maneira de resumir 2023. O ano deverá ser o mais quente já registrado conforme a temperatura média global se aproxima do aumento de 1,5 ºC acima dos níveis pré-industriais, limite estipulado pelo Acordo de Paris, até o fim do século. Tanto na América Latina quanto em outras regiões, os eventos deste ano ressaltaram a força da crise climática — das ondas de calor anormais no inverno às secas históricas e inundações que arrasaram cidades vulneráveis às oscilações do clima.

Também foi um ano de transformações políticas e grandes desafios econômicos para muitos países latino-americanos. Houve, porém, motivos para manter a esperança, como os avanços na expansão da energia renovável e as histórias de ativistas e comunidades que buscam soluções para problemas globais.

Ao longo do ano, o Diálogo Chino jogou luz nos desafios ambientais mais urgentes da América Latina, nas histórias esquecidas da região e na transformação das relações com a China. Aqui estão nossas reportagens preferidas do ano.

Nanaui Amorós, coordenadora de conteúdo multimídia

🥩 A carne bovina está perdendo espaço na América do Sul?

Man wearing a hardhat eating noodles with chopsticks
Liao come macarrão com carne no café da manhã antes de ir para o trabalho em Xinping, província de Sichuan, China. O consumo de carne bovina aumentou no país com o crescimento da classe média chinesa, embora a carne suína ainda seja a mais popular (Imagem: Xiaoye / Diálogo Chino)

Comida é algo que me desperta muito interesse, especialmente como brasileira. Quando sento à mesa todos os domingos para um almoço em família, a atração principal — além da música — geralmente é o churrasco. Conheço bem o impacto da pecuária, uma das principais responsáveis pelo desmatamento no Cerrado, na região central do Brasil, onde nasci e me criei. Porém, mesmo vendo as queimadas de perto, ainda não consegui abandonar completamente a carne bovina. Claro, tento comê-la menos, mas ela está tão enraizada em nossa herança cultural latino-americana que sinto como se abrisse mão de uma parte de mim.

Trabalhar com fotógrafes em diferentes continentes e escolher entre as mais de 350 fotos incríveis que recebemos foi um enorme desafio. Ver como as pessoas na China, na Argentina e em outras partes do Brasil consomem carne — ou defendem o fim desse hábito — me surpreendeu. No mundo todo, as pessoas estão deixando de consumir carne por diferentes motivos: alta nos preços, preocupações com o meio ambiente e o bem-estar animal, além de questões de saúde. À medida que mais e mais pessoas se fazem a mesma pergunta, também me questiono: será que eu poderia dar esse passo e me tornar vegetariana?

Jack Lo, editor da região andina

🇵🇪 Chancay: porto promete impulsionar comércio no Pacífico — a que custo?

O porto de Chancay, no Peru, é um dos maiores projetos de infraestrutura promovidos na América Latina pela Iniciativa Cinturão e Rota, da China. Com inauguração prevista para novembro de 2024, durante a cúpula da Cooperação Econômica Ásia-Pacífico, em Lima, o porto pode se tornar o maior centro do transporte marítimo da América do Sul e um dos mais importantes do Pacífico leste. Long Beach, nos Estados Unidos, e Manzanillo, no México, são atualmente os únicos portos do continente com capacidade para receber meganavios — Chancay será o terceiro. Apesar disso, comunidades do entorno denunciam irregularidades na construção do projeto.

O Diálogo Chino acompanha o andamento do projeto desde 2021. Este ano, voltamos ao local e conversamos com os diferentes atores envolvidos. O tema recebe pouca atenção da imprensa peruana, mas, à medida que sua inauguração se aproxima, seguiremos atentos aos desdobramentos das obras e aos impactos à população de Chancay.

Marina Bello, assistente editorial

🌳 Mulheres assumem linha de frente da conservação da Amazônia peruana

Woman with hand raised standing on a walkway in a rainforest
Ema Tapullima, líder de uma comunidade indígena Kukama-Kukamiria na região de Loreto, no Peru. Lá, ela monitora a conservação da floresta e de seus recursos naturais (Imagem: Sally Jabiel)

A interseção entre meio ambiente e gênero é um tema caro para mim e, nos últimos anos, temos buscado dar cada vez mais espaço a esse tipo de histórias no Diálogo Chino. Razões não faltam: as mudanças climáticas multiplicam as ameaças e aprofundam as desigualdades de gênero; enquanto isso, as mulheres assumem a linha de frente de proteção dos ecossistemas na América Latina.

A repórter Sally Jabiel produziu uma excelente reportagem sobre as líderes indígenas, engenheiras e biólogas que lideram a conservação voluntária na Amazônia peruana. Com imagens da floresta tropical e histórias das mulheres que a defendem, a matéria consegue ser inspiradora e, ao mesmo tempo, alarmante: o trabalho delas tem um valor inestimável, mas as ameaças estão aumentando. 

Foco da terceira conferência das partes signatárias do Acordo de Escazú — primeiro acordo regional dedicado à proteção de ativistas ambientais e dos direitos humanos —, a proteção delas e de outros que defendem o meio ambiente seguirá em nosso radar.

Alejandra Cuéllar, editora de México e América Central

☀️ Maior usina solar da América Latina vai cruzar terras indígenas no México

À medida que o mundo avança rumo à transição energética, muitas comunidades sentem os impactos dos projetos de energia renovável — um dos grandes focos de nossa cobertura.

Junto à Mongabay Latam, contamos o caso de resistência do povo Tohono O’odham, do noroeste do México, contra os planos para construir um dos maiores parques solares da América Latina. Peça do Plano Sonora para impulsionar a energia limpa no México, o projeto envolve a instalação de linhas de transmissão nos desertos de sal do Alto Golfo da Califórnia, local sagrado para os Tohono O’odham desde tempos ancestrais. O megaprojeto cobre dois mil hectares com 278 mil painéis solares e está programado para atingir um gigawatt de capacidade até 2027. Porém, indígenas e ambientalistas temem os impactos em uma área considerada Patrimônio Mundial da Humanidade pela Unesco.

Os Tohono O’odham argumentam que suas crenças e sua herança cultural foram desconsideradas no processo de aprovação do projeto, enfatizando a importância das salinas e das fontes de água doce para seu povo.

Linhas de transmissão do parque solar em construção em Puerto Peñasco, no deserto de Sonora, noroeste do México. A usina pode se tornar a maior da América Latina, mas enfrenta a resistência do povo Tohono O’odham e de ambientalistas, já que sua infraestrutura atravessa locais sagrados para os indígenas (Imagem: Sergio Müller)

Flávia Milhorance, editora de Brasil

🚜 Como a soja tomou conta de assentamentos familiares da Amazônia

Foram várias as reportagens relevantes que o Diálogo Chino produziu em 2023. Exploramos mais a fundo uma verdade inconveniente com a qual teremos que lidar: a transição energética não vem sem impactos, seja pelo uso excessivo da água na exploração de lítio, mineral usado em baterias elétricas, ou pela ameaça de usinas eólicas à biodiversidade. 

Também aprofundamos a colaboração de repórteres de diferentes países da América Latina, algo que tem se tornado uma marca nossa. Assim, conseguimos entender melhor como a lei europeia de desmatamento afeta de forma diferente o Brasil e o Uruguai ou como o mercado de veículos elétricos ganha impulso na América do Sul como um todo. 

Mas a reportagem que selecionei, sobre como a soja tomou conta de assentamentos familiares na Amazônia brasileira, tem um apelo muito pessoal, confesso. Isso porque fui me surpreendendo cada vez mais com a situação à medida que apurava a história. 

A soja costuma ser mais viável em áreas grandes e com aportes altos de capital. Mas o mercado está tão aquecido e o assédio é tão intenso no Centro-Oeste que antigos assentamentos de agricultores familiares, originalmente estabelecidos para a produção de alimentos, não conseguem resistir à monocultura da soja. Além disso, em um gráfico sobre os usos do grão no Brasil, ficou mais do que claro que ele serve majoritariamente ao consumo animal e à produção de biodiesel, e não ao consumo humano. 

Enquanto isso, como mostramos em uma reportagem do ano passado, a insegurança alimentar continua a avançar no país.

The Pertiles inspect an acerola tree
Há duas décadas, Evanir e Danilo Pertile vieram do interior do Sul do Brasil para buscar um pedaço de terra em Querência, na região amazônica. Agora, o cultivo de soja desafia pequenos produtores como eles (Imagem: Flávia Milhorance)

Fermín Koop, editor-chefe de América Latina

💧 Cidade uruguaia questiona uso excessivo de água para hidrogênio verde

Em 2023, o Diálogo Chino acompanhou de perto os processos de transição energética na América Latina, incluindo os planos dos países para o desenvolvimento de hidrogênio verde, combustível que desperta interesse no mundo todo. Atualmente, o hidrogênio é produzido principalmente a partir de combustíveis fósseis, como o gás, mas esse novo setor visa alavancar a produção por meio de energias renováveis — sobretudo a solar e eólica, abundantes em países como o Uruguai e o Chile.

Ramiro Barreiro viajou para Tambores, cidade de apenas 1,5 mil habitantes no norte do Uruguai, onde o governo e empresas privadas querem instalar um projeto-piloto de produção de hidrogênio verde, o Projeto Tambor. Porém, a construção dessa usina gera dúvidas e resistência na comunidade pelos possíveis impactos socioambientais, principalmente o consumo de água: seriam necessários entre 500 e 700 metros cúbicos de água por dia, obtidos de fontes subterrâneas. A reportagem trouxe as vozes de moradores, especialistas, autoridades e representantes da empresa, além das próprias impressões sobre a cidade e o projeto.

Patrick Moore, editor de América Latina

🎸 Música para árvores: a arte em defesa das florestas na Argentina

Uma das poucas histórias do Diálogo Chino que começou em um bar, a reportagem de Daniela López destaca as iniciativas inovadoras que usam a arte para promover a conservação das florestas em Córdoba, na Argentina. Entre elas, está a música “Plantas”, do trio musical Toch, em homenagem às espécies nativas da província — muitas delas ameaçadas ou extintas nas últimas décadas, inclusive diante do avanço de espécies invasoras. Exposições e experiências imersivas também buscam reconectar a população local com suas florestas.

A enxurrada de más notícias para o meio ambiente pode parecer implacável. Em meio às discussões sobre emissões globais, transições energéticas e mudanças sistêmicas, é fácil sentir-se desanimado e impotente. Encontrar maneiras de manter as pessoas inspiradas a agir é sempre um desafio e trazer o assunto ao nível local pode ser uma forma de lembrar que pequenas mudanças estão ao nosso alcance. A arte, por si só, não vai mudar o fluxo dos eventos, é claro, mas muitas vezes pode ser um ponto de partida para engajar mais pessoas. A multidão reunida no bar certamente entendeu a mensagem que a banda Toch quis passar com “Plantas”.

A squirrel monkey in tree
Macaco-de-cheiro na reserva da biosfera do Yasuní, no Equador, um dos lugares mais biodiversos do planeta. O referendo para decidir sobre a exploração de petróleo no Parque Nacional Yasuní, em agosto, escolheu acabar com as operações petrolíferas no interior do parque (Imagem: Flor Ruiz / Diálogo Chino)

Juan Ortiz, assistente editorial

🗳️ Ecuador set to vote on banning oil projects in Yasuní National Park

Em 20 de agosto, o Equador realizou a votação mais importante do ano para o meio ambiente na região: o referendo sobre a exploração de petróleo no Parque Nacional Yasuní, uma das áreas mais biodiversas da Amazônia e lar de dois povos indígenas em isolamento voluntário. O tema foi destaque nas campanhas dos presidenciáveis, que se enfrentaram na mesma data após uma corrida eleitoral marcada pela violência.

O resultado foi um estrondoso “sim” ao fim da extração petrolífera no Yasuní, contrariando a vontade do então presidente Guillermo Lasso. O novo mandatário, Daniel Noboa, prometeu respeitar a decisão do referendo e retirar as instalações da Petroecuador do local. Pelo menos em matéria energética, a posição do país agora parece sintonizada com a da vizinha Colômbia, que tem impulsionado planos ambiciosos para abandonar os combustíveis fósseis.

O futuro energético do Equador ainda é incerto. Com um mandato-tampão de um ano e meio, Noboa terá de encontrar alternativas aos royalties do petróleo para subsidiar programas de transferência de renda e controlar os preços da gasolina e do diesel. Caso não cumpra as expectativas em tempo recorde, já pode se preparar para ouvir os gritos dos sindicatos e movimentos indígenas nas ruas do país.

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