No final de 2020, a esperança da Colômbia de salvar sua cambaleante indústria do carvão por meio do aumento de suas exportações à China era remota, na melhor das hipóteses. No entanto, as vendas aumentaram 150% no ano passado, segundo a Associação Nacional de Comércio Exterior da Colômbia (Analdex).
Será que a China pode ser de fato um mercado promissor para o carvão colombiano? No momento, o panorama é incerto.
Em 2021, a China gerou 53% da energia à base de carvão do mundo, acima dos níveis pré-pandêmicos de 50% em 2019, segundo um relatório da organização Ember Climate. A produção doméstica de carvão aumentou 4,6% em 2021, e as importações também subiram para atender ao aumento da demanda, de acordo com o Escritório Nacional de Estatísticas.
A China consumiu 3,41 milhões de toneladas de carvão colombiano no ano passado, acima dos 1,52 milhão de 2020, de acordo com o Sistema Colombiano de Informação da Mineração. Entretanto, a longo prazo, o compromisso chinês de reduzir as emissões de carbono pode ser negativo para exportadores colombianos de carvão.
3,4 milhões
É o valor, em toneladas de carvão, que a Colômbia exportou para a China em 2021
“As expectativas a médio e longo prazo continuam diminuindo”, disse Nicolás Rincón, diretor de assuntos econômicos da Analdex, ao Diálogo Chino. “A China fez anúncios, e agora com a COP26 [a Conferência da ONU sobre Mudança Climática de 2021], as políticas de descarbonização das atividades econômicas são mais rigorosas e comprometidas a nível global”.
A rápida recuperação da China, depois da recessão de 2020, é uma das principais razões para o aumento do consumo de carvão. O Departamento Nacional de Estatísticas estima em 8,1% o crescimento do PIB chinês em 2021. O consumo total de energia foi de 5,21 bilhões de toneladas de carvão, 5,2% a mais que em 2020.
Carvão: compromissos e perspectivas
Na Assembleia Geral da ONU em setembro de 2021, o presidente da China, Xi Jinping, declarou que o país iria suspender o financiamento público de termelétricas a carvão no exterior, anúncio que veio no aniversário de um ano de sua promessa de atingir a neutralidade de carbono em 2060. E, em um plano climático revisado, lançado antes da COP26, foi estabelecida a meta de atingir o pico de emissões até 2030. No entanto, Xi se recusou a assinar o compromisso de eliminação gradual do carvão na Cúpula de Glasgow.
Além desses compromissos, existem outros fatores que tornam o carvão menos atraente. Ilaria Mazzocco, do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais de Negócios e Economia da China, argumenta que o consumo de carvão na China, e no mundo em geral, cairá por razões econômicas, e não ambientais. Mazzocco ressalta que o carvão é cada vez mais um “ativo encalhado” — que é desvalorizado — já que fontes renováveis como a solar são, em muitos lugares, mais baratas e competitivas.
China precisa de carvão
O consumo de eletricidade da China está aumentando, e 68% da demanda é atendida por termelétricas a carvão. Segundo a Ember Climate, seu aumento de 337 terrawatt-hora (TWh) no consumo de energia a carvão na primeira metade de 2021 excede toda a energia gerada pelas usinas a carvão na União Europeia no mesmo período.
O aumento pressiona o fornecimento de mineral da própria China. Embora ela tenha produzido 3,67 bilhões de toneladas em dezembro de 2021 e importado 304 milhões de toneladas em 2020, o carvão disponível ainda não atende às necessidades energéticas que impulsionam o crescimento econômico chinês.
A redução da produção de carvão na China tem sido uma tendência de longo prazo que tem pouco a ver com a recente campanha do governo para reduzir as emissões
No final de setembro e início de outubro de 2021, mais da metade das províncias da China sofreu racionamento de energia, em grande parte porque o preço do carvão, que não é fixado pelo governo, aumentou, mas o preço da energia, que é fixado pelo governo central, permaneceu estático. Termelétricas a carvão, portanto, não tiveram nenhum incentivo econômico e manobraram para reduzir a taxa de operação, quer deixando de comprar carvão por um período, quer dizendo que suas usinas tiveram que passar por manutenção.
No contexto da transição energética global, Zhang Shuwei, chefe do Centro de Pesquisa Ambiental de Draworld em Pequim, chamou a combinação dos altos preços do carvão com a escassez de energia de “o preço certo no momento errado” — o que significa que tais preços serão essenciais no futuro para se atingir o pico e a neutralidade de carbono, mas não são ideais em um momento de crise energética.
O professor Yuan Jiahai, especialista em energia da Universidade de Energia Elétrica do Norte da China, disse recentemente ao China Dialogue que a oferta e a demanda, e não as promessas de picos de emissões, foram o fator-chave da escassez no ano passado:
“A escassez de carvão resultou da pressa de algumas localidades em fechar as minas de carvão. Mas em geral, a redução da produção de carvão tem sido uma tendência de longo prazo que tem pouco a ver com a recente campanha do governo para reduzir as emissões”.
Segundo Mazzocco, a escassez ocorreu por mau planejamento. “Não havia uma projeção adequada da demanda. Isto tinha mais a ver com instituições do que com políticas para reduzir as emissões de carbono”, ela disse.
A resposta da China foi produzir mais carvão e estabelecer preços máximos de 1.200 yuan (R$ 926) por tonelada de carvão, empurrando os preços para baixo.
“A China basicamente abriu suas portas para a produção de carvão”, disse Natalie Biggs, que pesquisa o mercado de carvão na consultoria Wood Mackenzie. “Ela vai abrir novas minas que não estavam programadas e deu luz verde a 47 minas a céu aberto que tinham problemas ambientais ou territoriais, impulsionando a produção de carvão”.
A equipe de Briggs explicou que as minas a céu aberto geralmente têm que solicitar novas áreas para operações minerárias quando os recursos existentes estão perto do fim. As minas precisam de uma licença de exploração do governo chinês; a secretaria ambiental verifica se elas cumpriram com os planos de proteção ambiental; e os proprietários de minas devem então elaborar planos de proteção para as novas terras.
“Há muitas questões para as minas obterem a aprovação em novas terras”, afirmou a equipe de Briggs, acrescentando: “as questões de terra e ambientais são as principais”.
Efeito sobre a Colômbia
A Colômbia é o 47º maior emissor do mundo, segundo dados da World Population Review, respondendo por 0,23% das emissões anuais globais. A nação não assumiu compromissos na COP26 relacionados à produção de carvão, apenas à redução das emissões. Uma das principais promessas do presidente Iván Duque é reduzir as emissões de CO2 em 51% até 2030. O governo também adotou uma meta de neutralidade de carbono para 2050.
Embora o plano de longo prazo não inclua medidas concretas de mitigação nem metas setoriais, ele indica que o Ministério da Mineração vem trabalhando para compensar as emissões do carvão colombiano queimado no exterior. Em dezembro de 2020, a Glencore, única proprietária da El Cerrejón, maior mina de carvão da América Latina e uma das maiores do mundo, também prometeu zerar as emissões de carbono até 2050.
O carvão é cada vez mais um “ativo encalhado”
Devido à forma como os royalties e impostos de mineração são estruturados na Colômbia, as receitas do carvão têm forte impacto nos orçamentos de governos federal e locais. Enquanto em 2020 a queda econômica da pandemia fez com que os preços do carvão caíssem para US$ 33 por tonelada, em 2021 eles chegaram a mais de US$ 200.
“Houve aumento na demanda em 2021, mas a oferta não se adapta rapidamente a ela”, disse Rincón ao Diálogo Chino. “Então o petróleo começa a subir, o carvão começa a subir, e outros produtos começam a subir”.
Ele acrescentou que as tensões comerciais da China com fornecedores estabelecidos também beneficiaram a Colômbia. Em 2021, a China congelou as importações de carvão australiano, seu segundo maior fornecedor depois da Indonésia, devido ao mal-estar gerado após uma investigação australiana sobre a origem da Covid-19.
Mais carvão colombiano para a China?
“A China importou uma enorme quantidade de carvão [em 2021], e isso é anormal. Não quer dizer que a Colômbia não possa [continuar] exportando para a China, mas não vai exportar tanto. Não vai crescer como cresceu”, previu Biggs.
Segundo Biggs, a Colômbia foi um fornecedor estável de carvão de boa qualidade e baixo custo para os mercados internacionais, mas com mercados como o da Europa em declínio, a Colômbia deve olhar para o Pacífico em busca de crescimento.
Mas o país enfrenta um grande obstáculo pela frente — é o mais distante entre os fornecedores de carvão à China. Se perdesse sua vantagem competitiva por causa dos custos de transporte, a Colômbia poderia deixar de ser o quinto maior exportador mundial de carvão para se tornar um país marginal no mercado internacional, acrescentou Biggs.
Um oceano de distância
A Colômbia é o mais distante entre os fornecedores de carvão à China, aumentando o tempo e custos de exportação.
De acordo com Juan Miguel Durán, presidente da Agência Nacional de Mineração, o governo colombiano ofereceu uma resposta em três frentes para o conturbado setor.
A primeira vertente é a promoção do carvão nos mercados asiáticos durante as conferências empresariais. Mas essa solução enfrenta uma dificuldade. Embora as conferências possam ajudar produtores a estabelecer redes comerciais, ela não muda o problema da distância e seus custos. A segunda é a Agenda do Carvão, que busca aumentar a competitividade, melhorar as práticas e fortalecer as instituições, segundo Tatiana Lorena Aguilar, diretora no Ministério de Minas e Energia da Colômbia. A terceira é a diversificação da mineração para compensar a perda de receitas provenientes do carvão.
“A Agência Nacional de Mineração discutiu a exploração de outros minerais, como o cobre, nos quais podemos diversificar a matriz de exportação da mineração”, disse Rincón.
Finalmente, Biggs disse que, enquanto a China não financia novas termelétricas a carvão na Colômbia, as empresas chinesas expressaram interesse em adquirir minas no país. Segundo a imprensa colombiana, o ministro da Mineração e Energia, Diego Mesa, disse que as empresas chinesas podem estar interessadas na mina Prodeco, no departamento de César, que antes pertencia à canadense Glencore, ou a El Cerrejón, no departamento de La Guajira. Acredita-se que as negociações entre as empresas chinesas e os principais acionistas da BHP Billiton e AngloAmerican estejam em andamento.
Apesar da potencial participação direta da China na produção colombiana de carvão, mitigando em parte o declínio nos mercados europeus, nenhum analista contactado para este artigo acredita que o país será relevante para reverter as previsões negativas da indústria no país sul-americano.