Pelo menos 200 defensores de causas ambientais e fundiárias foram assassinados em 2016, tornando este o ano mais letal já registrado, de acordo com os últimos dados divulgados pela Organização Não-Governamental (ONG) Global Witness, do Reino Unido.
O mais recente relatório da organização mostra o alastramento de uma “crise” pelo mundo, uma vez que o número de países onde foram registradas mortes subiu de 16 para 24 no ano passado. Um total de 60% das mortes ocorreu na América Latina, o que significa que a região continua sendo a mais perigosa do mundo para quem luta contra a degradação ambiental.
O Brasil, que foi palco de conflitos especialmente sangrentos por terra nos últimos meses, mais uma vez saiu na frente, com o maior número de homicídios registrados: 49 casos. A Nicarágua teve a maior taxa de homicídios per capita: 11 e a Colômbia bateu recorde com 37 mortes em um ano, afirma o relatório.
“Esses relatórios contam uma história muito sombria. A luta para proteger o planeta está intensificando rapidamente e o custo dela pode ser calculado em vidas humanas”, comentou Ben Leather, assessor de campanhas da Global Witness.
Na Ásia, em países como a Índia e as Filipinas, toda resistência contra grandes projetos de mineração tem sido combatida com repressão e violência sancionada pelo estado. Na Índia, o número de assassinatos triplicou e as Filipinas se destacam como o país mais letal da região, com 28 homicídios.
A exploração madeireira e a agricultura, incluindo a pecuária extensiva, também geram muitos conflitos, diz o relatório.
A paz é perigosa para a Colômbia
As Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), grupo guerrilheiro colombiano, abandonaram o controle de vastos territórios rurais no ano passado como parte de um histórico processo de paz. No entanto, a decisão trouxe mais desmatamento e degradação ambiental para a região.
Em 2016, o desmatamento na Colômbia aumentou 44% em relação ao ano anterior, atingindo uma área de mais de 1.700 km2 (cerca de 180.000 hectares). As áreas vazias passaram a ser ocupadas por grupos criminosos envolvidos na exploração madeireira e na mineração ilegal, segundo dados recentes divulgados pelo Instituto de Hidrologia, Meteorologia e Estudos Ambientais do governo colombiano (IDEAM).
As regiões amazônicas de Putumayo, Caquetá, Meta e Guaviare, no sul da Colômbia, foram as mais afetadas.
“Eles [FARC] não eram ambientalistas, mas regulavam a atividade na região. Como tinham armas, as pessoas respeitavam”, afirmou recentemente a ativista Susana Muhamad para o jornal The Guardian. Sob a vigilância das FARC, o desmatamento causado por civis limitava-se a dois hectares por ano, pois dessa forma o grupo conseguia manter a cobertura florestal que proporcionava proteção contra as forças do governo.
O aumento do desmatamento trouxe o aumento do número de assassinatos de defensores ambientais e da terra na Colômbia.
“O processo de paz na Colômbia alimentou, paradoxalmente, a violência contra aqueles que defendiam suas terras e o meio ambiente contra indústrias destrutivas”, afirma Billy Kyte, líder da campanha pelos defensores dos direitos ambientais e da terra da Global Witness.
Kyte explicou que as comunidades retornam para recuperar as terras perdidas durante o conflito armado, mas agora têm de enfrentar grupos paramilitares, grandes latifundiários e gangues criminosas que buscam lucrar com a abundância de recursos naturais.
“É imperativo que, antes de pensar em promover projetos de desenvolvimento que levam à degradação ambiental, o governo colombiano fortaleça o estado de direito na zona rural e torne as áreas seguras para as comunidades”, complementa Kyte.
Metodologia questionada
No início deste ano, pelo menos um especialista questionou a metodologia utilizada pela Global Witness em um relatório especial que detalhava a situação de Honduras. Foi alegado que o relatório não distinguiu os ambientalistas assassinados das vítimas de conflitos agrários.
“O relatório da ‘Global Witness’ não resiste à análise científica”, disse José Herrero, vice-presidente da fundação de conservação FUCSA, argumentando que a “confusão” que foi feita entre as categorias de vítima no relatório teve como objetivo inflar os números.
Kyte, que sofreu intimidação e foi ameaçado de prisão ao promover o relatório em Tegucigalpa, capital hondurenha, defendeu os métodos de coleta de dados usados pela Global Witness.
“Nós compilamos dados sobre os defensores de causas fundiárias e ambientais – pessoas que defendem a terra ou os direitos ambientais. Nossas definições e critérios para inclusão são e sempre foram muito claros – não registramos apenas os assassinatos de ambientalistas”, disse ele.