Junho é o mês do orgulho LGBTQIA+ em todo o mundo. É um momento de reconhecimento, visibilidade e luta pela igualdade. Porém, em muitos países, as marchas deste ano têm como pano de fundo eventos climáticos extremos, como o recorde de altas temperaturas e enchentes devastadoras, além de previsões alarmantes de cientistas sobre o aquecimento global. Diante desses desafios urgentes, tem-se destacado cada vez mais a conexão entre a crise climática e as lutas enfrentadas pela comunidade LGBTQIA+.
Em uma palestra no TEDx em 2018, a renomada bióloga transgênero colombiana Brigitte Baptiste explicou como algumas espécies de palmeiras mudam de sexo para sobreviver. Já alguns sapos e pererecas, que “parecem viver em uma constante parada do orgulho gay”, evoluíram com uma enorme diversidade de cores e formas para se adaptar a ambientes hostis. Outras espécies de animais apresentam formas de organização familiar entre indivíduos do mesmo sexo para se proteger de ameaças externas. “Não há nada mais queer do que a natureza”, concluiu Baptiste no evento.
Embora a diversidade natural seja amplamente valorizada, para as pessoas LGBTQIA+ na América Latina ela é, muitas vezes, uma realidade mais dura, com índices alarmantes de violência e mortalidade. Entre 2014 e 2020, pelo menos 3.514 pessoas LGBTQIA+ foram assassinadas na América Latina e no Caribe. É uma luta próxima à dos ativistas ambientais, que muitas vezes colocam suas vidas em risco pela defesa do planeta. Entre 2012 e 2022, mais de 1,3 mil ambientalistas foram mortos na região, que é de longe a mais letal para ativistas socioambientais.
O Dialogue Earth conversou com Aurélien Guilabert, ativista natural da França que defende os direitos LGBTQIA+ e o meio ambiente no México. Guilabert criou a filial mexicana do Extinction Rebellion, movimento global que pressiona governos por mais ações climáticas e ambientais. Além disso, concorreu à Assembleia da Cidade do México e trabalhou na prevenção do vírus HIV e na promoção de leis de identidade de gênero no país. Guilabert explicou como sua experiência de mais de uma década ajudou-lhe a entender as conexões entre a defesa dos direitos humanos e a proteção da natureza.
Dialogue Earth: Como os movimentos LGBTQIA+ e de defesa do meio ambiente estão interligados?
Aurélien Guilabert: Vejo paralelos incipientes entre os movimentos, mas no México eles estão fragmentados. Há muitas divisões internas nos movimentos, diferentemente de países que conseguiram uni-los com mais transversalidade. Há pelo menos oito anos, desde que faço parte do comitê da marcha do orgulho LGBTQ+ [na Cidade do México], temos impulsionado a remediação ambiental — não como reivindicação da marcha em si, mas em nossas ações. Por exemplo, buscamos evitar a geração de lixo durante as marchas do orgulho e pedimos aos participantes que não comprem produtos plásticos. Essas ações têm aparecido cada vez mais, e acho isso interessante.
O que falta para que as causas ambientais ganhem mais força no movimento LGBTQIA+?
Há um problema com o governo da Cidade do México, que rejeitou a proibição de grandes veículos [como carros alegóricos e trios elétricos] nas paradas do orgulho LGBTQ+. O que está por trás disso é o dinheiro, porque as pessoas cobram para entrar em um veículo como esse, e a posição de destaque no desfile depende do quanto você paga. Paris, por exemplo, não tem mais esses carros nos desfiles, e o mesmo ocorre em outras grandes cidades. Estamos defendendo a volta da marcha a pé, para evitar que ela seja cooptada por motoristas, que representam um modelo patriarcal ligado aos combustíveis fósseis. No fim das contas, a luta tanto da diversidade sexual e de gênero quanto do ambientalismo é contra a essência do patriarcado.
Também é necessário que as pessoas se informem mais e que nós, enquanto ativistas, também redefinamos o significado da marcha. Hoje, ela é uma festa. Concordo que deve ser uma festa, porque devemos comemorar o progresso — devemos comemorar nosso orgulho, nossas identidades, nossa orientação —, mas não devemos esquecer que a marcha é essencialmente política. Nas primeiras passeatas, as pessoas eram presas. Hoje temos a liberdade de ir às ruas e, por isso, muitas pessoas esquecem o aspecto político. É fundamental recuperar esse elemento político na marcha, sem esquecer que vivemos no segundo país mais violento do mundo contra a população LGBTQIA+ e ainda somos mortos por nossa identidade de gênero ou orientação sexual.
Quais são as vulnerabilidades compartilhadas pela comunidade LGBTQIA+ e por ativistas ambientais?
O ponto em comum é a violência no México, um dos líderes em assassinatos e agressões contra essas populações. Há também a violência simbólica, a “violência por omissão”, da qual não se fala muito. A omissão é violência, e o silêncio, cumplicidade. É uma frase que não nos cansamos de repetir. O que significa isso? Quer dizer que o governo está fazendo muito pouco ou adotando medidas insuficientes diante da exclusão dessas populações diversas e da crise climática.
Quais são suas esperanças para o futuro em relação a ambos os movimentos?
As novas gerações. Porque esses dois movimentos, tanto o climático quanto o da diversidade sexual e de gênero, já foram totalmente assumidos pelas novas gerações. Há um novo paradigma que cresce rapidamente, e os jovens estão desconstruindo o modelo patriarcal que ainda domina o mundo. Para os jovens de 12, 13 anos, os pré-adolescentes e adolescentes, a questão da identidade não os preocupa, a questão da orientação não os preocupa, e eles já têm uma consciência climática diferente daquela das gerações que hoje têm 40, 50 anos. É isso que me dá mais esperança do que qualquer outra coisa.