Espanha e 13 bancos privados — quer se transformar no “banco verde” da região. Para isso, estabeleceu a meta de destinar 40% de seu financiamento a projetos verdes até 2026 — uma fatia que correspondia a 26% em 2021.
Mas não será um caminho simples, de acordo com Alicia Montalvo, diretora de ação climática e biodiversidade do CAF. O meio ambiente, diz ela, nem sempre é prioridade na região, e falta coordenação entre os países para executar projetos conjuntos de redução de emissões e proteção da biodiversidade.
O Diálogo Chino conversou com Montalvo na Innovate4Climate, conferência anual de financiamento climático do Banco Mundial. Ela explicou o papel do financiamento verde para a América Latina e a decisão do CAF de continuar investindo em gás natural. Também fez um apelo para que a natureza seja valorizada economicamente como forma de facilitar investimentos sustentáveis.
Diálogo Chino: Que medidas o CAF tomou para focar seu financiamento em projetos sustentáveis na América Latina e se tornar um ‘banco verde’?
Alicia Montalvo: Estamos integrando as questões relacionadas às mudanças climáticas e à biodiversidade em todos nossos financiamentos na região: da infraestrutura e energia aos recursos hídricos. É uma agenda verde e azul, pois também destinamos US$ 1,25 bilhão para a proteção de ecossistemas costeiros e marinhos entre 2022 e 2026. Mas não se trata só de nosso financiamento: precisamos que os países elaborem bons projetos. Isso não é fácil em uma região que nem sempre tem prioridades ligadas à sustentabilidade.
Embora o CAF tenha se comprometido a aumentar o financiamento verde, ainda financia projetos de gás natural na América Latina. Por quê?
Os acionistas do banco nos pedem para seguir financiando projetos de gás, entendendo que isso faz parte da transição energética. Buscamos esses projetos para substituir fontes de energia mais poluentes, e não apenas para financiar o gás natural. Ele só é “verde” se substituir outro combustível mais poluente. A transição deve ser justa e permitir que cada país tenha seu próprio pico de emissões associado aos combustíveis fósseis, de acordo com sua capacidade tecnológica. As energias renováveis ainda não são suficientemente competitivas em vários países da América Latina, e a transição energética levará algum tempo.
Procuramos projetos de gás para substituir energias mais poluentes, e não para financiá-losAlicia Montalvo, diretora de ação climática e biodiversidade do CAF
Em 2022, o CAF aprovou mais de US$ 14 bilhões para projetos na América Latina. Mas o financiamento necessário rumo às economias sustentáveis é muito maior — algo bastante destacado por alguns presidentes. Como os governos podem aumentar esse financiamento?
É preciso formar parcerias entre investidores locais e internacionais. Os países precisam mobilizar recursos internamente para questões ambientais, que podem então ser canalizados em fundos internacionais. O CAF trabalha com fundos globais, como o Fundo Verde para o Clima, e, em muitos casos, nos pedem para sermos co-financiadores junto aos países. Também é importante trabalhar com uma perspectiva regional. Estamos desenvolvendo projetos regionais, principalmente para a proteção da biodiversidade, como no caso do corredor marinho do Pacífico Oriental. Mas ainda falta colaboração entre os países para trabalhar dessa forma.
Os mercados de carbono têm se expandido na América Latina como um mecanismo para financiar projetos de redução de emissões. Porém, vários deles geram conflitos com povos indígenas. Como deve ser o trabalho junto às comunidades tradicionais?
A maior parte das florestas com capacidade de absorção de carbono está em territórios indígenas. Além disso, as práticas ancestrais das comunidades para proteger as florestas têm dado bons resultados. É importante que as comunidades decidam sobre o uso das florestas e possam trabalhar de forma integrada. Os mercados de carbono devem ser acessíveis e compreensíveis, e isso fará com que as pessoas conheçam as regras do jogo. Eles podem ser perigosos sem regras claras. Precisamos trabalhar com cautela e muito diálogo.
Embora seja necessário aumentar o financiamento para a biodiversidade e a ação climática na América Latina, muitos países já têm altos níveis de dívida. Alguns governos pedem a troca de dívidas (swaps) por natureza, como no caso recente do Equador para impulsionar a conservação nas Ilhas Galápagos. É possível que esses mecanismos se tornem mais comuns?
Vejo espaço para mais swaps de dívida, mas temos que analisar os riscos dessas operações — se mal planejadas, podem limitar o acesso de um país a novos fundos. Há outras alternativas que podem ser usadas. Os países podem refinanciar suas dívidas e, ao fazê-lo, criar fundos destinados à conservação. Os títulos verdes e azuis são áreas em que também estamos trabalhando em vários projetos-piloto. O problema é que, globalmente, os títulos estão muito focados na redução de emissões, mas não na adaptação climática ou na biodiversidade. Isso precisa ser mais trabalhado.
Você havia mencionado a importância de ministros de Economia incorporarem perspectivas ambientais em suas políticas nacionais. Por que isso é importante para a América Latina?
Os ministros da Fazenda já falam muito sobre mudanças climáticas. Isso é bom, mas precisamos acrescentar a perspectiva da biodiversidade. Eles sabem do risco financeiro de eventos climáticos extremos, mas não falam sobre os efeitos que a perda da biodiversidade tem na economia. Eles precisam entender que investir em infraestrutura resiliente é muito melhor do que ter de restaurar a infraestrutura após ela ter sido afetada. Isso não é algo que possa ser mudado rapidamente e requer o envolvimento de organizações internacionais.