As empresas chinesas entraram em cheio no mercado automotivo brasileiro quando o governo incentivou a população a comprar carro reduzindo o Imposto sobre Produto Industrializado (IPI). Houve uma explosão de vendas no setor. Pelo menos 10 fábricas chinesas se instalaram no Brasil até que a presidente Dilma Rousseff, no final de 2014, começou a mudar política econômica. Resultado: a indústria automotiva vive hoje um momento de retração na demanda após anos de pujança nas vendas e de novos investimentos em unidades industriais. O atual quadro afeta diretamente o coração de montadoras chinesas que apostaram no mercado brasileiro, já que seus produtos são vendidos no Brasil a preços competitivos em relação a modelos tradicionais. Pelo menos 10 fábricas estão com operações no país: JAC Motors, Effa, Chery, Rely, Jinbei, Hafei, Lifan, Byd, Changan e Geely. Destas, JAC Motors e Chery estão mais adiantadas quando se trata de fábricas, tentam se firmar num mercado extremamente competitivo, em meio a regras cada vez mais rígidas para fabricação nacional e agora com algumas restrições poluidoras. “É importante que, em um cenário em que o governo conceda futuros benefícios às empresas, estes sejam acompanhados de contrapartidas voltadas ao aumento da eficiência energética veicular”, destaca um estudo realizado pela Coppe-UFRJ, uma das mais importantes instituições de pesquisa em energia do país, ligada à Universidade Federal do Rio de Janeiro, e o Greenpeace. As entidades ressaltaram que, quando o governo brasileiro reduziu o IPI de forma acentuada, em 2008, durante a crise financeira mundial sem exigir contrapartida das montadoras, perdeu “excelente chance de iniciar um programa de aumento de eficiência energética arrojado”. Com uma frota de 86,7 milhões de veículos, dos quais 47,9 milhões são automóveis, o Brasil enfrenta graves problemas de poluição do ar por causa das emissões dos automotores. 95% da poluição atmosférica são provocadas pelos veículos movidos a combustíveis fósseis. Dados do Inventário Nacional de Emissões de Veículos, do Ministério do Meio Ambiente, demonstram que os automóveis ainda são os principais poluidores do ar nas grandes cidades, apesar da implantação de programas que buscam controlar a poluição de veículos automotores. Um deles é o rodízio de veículos, implantando em 1997 na cidade de São Paulo que tem uma frota de 7 milhões de veículos. O outro é Programa de Controle da Poluição do Ar em Veículos Automotores (Proncove). Em vigor desde o início da década de 90, estabelece a adoção de catalisadores e dispositivos que retêm vapores de combustíveis nos modelos e forçou, em 2014, a saída de linha de motores antiquados, que não se enquadravam nos limites de poluição e emissões. Segundo relatório da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a poluição por material particulado e ozônio será, até 2050, a principal causa de morte no mundo relacionada ao meio ambiente. Em 2011, a poluição atmosférica foi responsável pela morte de dois milhões de pessoas no mundo (65% na Ásia), um crescimento mais de 200% acima do registrado 10 antes, quando o número era de 800 mil. Na Europa, esse número é de 310 mil mortes prematuras, com um custo entre 427 e 790 bilhões de euros. Segundo a Associação Brasileira das Empresas Importadoras e Fabricantes de Veículos Automotores (Abeifa), em fevereiro houve retração de 22,9% no total de unidades emplacadas ante janeiro (5.764 contra 7.478), e de 32,5% na comparação com fevereiro de 2014, quando foram emplacadas 8.544 unidades. Isso acontece num momento em que o país enfrenta uma forte conjuntura econômica negativa, com altos índices de inflação, na casa dos 8% nos últimos 12 meses, real desvalorizado frente ao dólar, altas taxas de juros e queda no índice de confiança do consumidor. A Abeifa considera que o primeiro semestre manterá ritmo difícil, já que o desempenho das empresas está associado a bons índices macroeconômicos – ao que tudo indica, devem demorar a retornar. “É muito prematuro qualquer comentário sobre uma reação do mercado”, afirma Marcel Visconde, presidente da Abeifa. A soma de elevada oferta, renda baixa e economia patinando tem como resultado queda nas vendas. Junta-se a esse quadro o fato que o Brasil experimenta uma oferta sem precedentes de variedade de marcas e modelos para todos os gostos e bolsos. Como parte da política brasileira de se priorizar fabricação nacional, o governo decidiu restringir a importação de modelos com a elevação do IPI, um dos mais relevantes do mercado em 30 pontos percentuais. A medida seria suspensa para montadoras que se enquadrassem num programa de novas fábricas no país. O chamado Inovar Auto é, segundo a definição oficial, um regime que tem como objetivo “a criação de condições para o aumento de competitividade no setor automotivo, produzir veículos mais econômicos e seguros, investir na cadeia de fornecedores, em engenharia, tecnologia industrial básica, pesquisa e desenvolvimento e capacitação de fornecedores”. Vale até 2017. Além disso, o Inovar-Auto estabeleceu desconto de até dois pontos percentuais do IPI para empresas que reduzissem ainda mais as emissões, ficando abaixo do valor de 1,82 MJ/km – o que corresponderia a uma melhora nas emissões em 12% em 2011. “Estamos bem confortáveis com esse incentivo à procura de novas tecnologias, pois antes mesmo de o Inovar Auto ser redigido, já prevíamos a instalação junto com a fábrica de um Centro de Pesquisa e Desenvolvimento”, dizem representantes da montadora chinesa JAC, que vai instalar sua fábrica no Nordeste brasileiro. Esse desconto seria válido entre 2017 e 2020 e progressivo: os dois pontos percentuais seriam concedidos para veículos com emissão de 1,68 MJ/km, uma redução de quase 20%, equivalente à meta europeia. “O mercado automotivo brasileiro é visto como prioridade para a empresa, que investe pela primeira vez numa fábrica de automóveis 100% completa fora da China”, destacou a Luis Curi, vice-presidente da Chery Brasil, que vendeu 9.547 veículos em 2014, 1.522 a mais do que os 8.025 de 2013.