O ano de 2019 marcou o momento em que as empresas chinesas finalmente conseguiram abrir caminho e chegar à Colômbia, o país latino-americano que talvez fosse, até então, o mais cético em relação a investimentos do segundo maior parceiro comercial da região.
Embora, a mineradora de ouro Continental Gold tenha sido adquirida pelo grupo chinês Zijin Mining há duas semanas, foi na verdade o setor de transporte e de infraestrutura que de fato abriu as portas para o capital da China e para as empresas chinesas na Colômbia. Quatro negócios provam isso: o contrato para construir o tão esperado metrô de Bogotá, a entrada de frotas de ônibus elétricos em Medellín e Cali, a concessão de uma rodovia e a construção de uma linha de trem na região metropolitana de Bogotá.
Isso marca uma reviravolta notável no relacionamento entre os dois países, embora a Colômbia continue sendo um dos poucos países da região que a não aderir à iniciativa chinesa do Cinturão e Rota. O próprio embaixador em Bogotá, Xu Wei, reconheceu em outubro que “devido à falta de conhecimento e de confiança, não temos até o momento uma relação econômica e comercial muito boa”.
O metrô de Bogotá será chinês
Em outubro, Bogotá escolheu duas empresas chinesas como vencedoras da licitação para a construção da primeira linha de seu metrô a partir de 2020.
Essa decisão — cujo contrato foi assinado em 27 de novembro — deve pôr fim a uma saga que durou mais de meio século em Bogotá, onde sucessivos planos para a construção do sistema de metrô foram concluídos e abandonados, enquanto os cidadãos tratavam do assunto mais como mito do que como uma realidade viável. Enquanto cidades do mesmo tamanho, como Lima, construíam os seus metrôs, a capital colombiana, de 7 milhões de habitantes, permanecia paralisada.
A empresa responsável pela obra será a APCA Transmimetro, um consórcio formado pela China Harbour Engineering Company Limited (uma subsidiária da gigante estatal China Construction Communications Company, que ocupa a 110ª posição no ranking das 500 maiores empresas globais da revista Fortune), com 85%, e pela Xi’an Metro Company Limited, uma empresa da província de Shaanxi que opera principalmente na China e foi responsável pela construção e operação do metrô de Xian, com 15%.
No final, competindo com uma única rival e depois de apresentar a oferta mais baixa de 13,8 bilhões de pesos (cerca de 4,5 bilhões de dólares), o consórcio chinês foi o vencedor da licitação do metrô de Bogotá, apesar de ter pouca experiência na construção de metrôs e — como noticiou o Diálogo Chino nesta reportagem — de ter contra si o peso de escândalos que cercaram alguns de seus projetos em países como Costa Rica, Panamá, Sri Lanka e a própria China.
Sua missão será construir a primeira linha deste metrô elevado, cujo projeto prevê 23,96 quilômetros de viadutos e 16 estações, cruzando a capital colombiana de norte a sul. Os cálculos da Prefeitura de Bogotá são de que o sistema poderá transportar 72 mil passageiros por hora, ajudando a reduzir a pressão no sistema de ônibus de trânsito rápido (ou BRT) da Transmilenio. Embora seus ônibus vermelhos hoje representem a metade do uso do transporte de Bogotá, sua infraestrutura já não consegue mais suportar a demanda.
Os únicos clientes do trem intermunicipal
O metrô não é a única carência pendente do sistema de transporte em Bogotá. Outro projeto fundamental para a capital é o trem suburbano que ligará a cidade a quatro de seus municípios mais populosos.
O Regiotram do Ocidente, projetado para começar a operar em 2023, será um sistema ferroviário baseado em energia elétrica que cobrirá os 41 quilômetros que separam o centro de Bogotá e Facatativá, passando, ao longo de 17 estações, por Madrid, Funza e Mosquera.
Esses municípios concentram uma parte importante da indústria local e também são cidades-dormitório para milhares de pessoas que vão trabalhar diariamente em Bogotá. No total, 465 mil pessoas vivem nessas cidades, de acordo com o censo de 2018. O primeiro trem intermunicipal na Colômbia pode transportar até 120 mil passageiros por dia, reduzindo o tempo de transporte, que hoje pode levar até duas horas, a 50 minutos.
Houve várias empresas interessadas no projeto, que custará 3,4 bilhões de pesos (1 bilhão de dólares), e cuja licitação será concedida no próximo dia 23 de dezembro, mas, no final do processo, a única proposta enviada foi a da China Civil Engineering Construction Corporation (CCECC). Essa subsidiária da gigante estatal China Railway Construction Company (CRCC), que ocupa a 59ª posição na lista de empresas da Fortune 500, ainda não tinha projetos na Colômbia, embora esteja construindo três projetos de rodovias no Equador.
Os primeiros ônibus ecológicos saem às ruas
Este ano, duas cidades colombianas se juntaram a outros pioneiras na América Latina, como Santiago do Chile, e passaram a ter frotas de ônibus públicos movidos a energia elétrica.
Em novembro, Medellín adicionou os primeiros 17 ônibus elétricos fabricados pela empresa chinesa BYD ao seu sistema de transporte público Metroplús. A compra de 64 ônibus — que tornarão a segunda maior cidade colombiana na proprietária da segunda maior frota elétrica da região, com recursos totalmente provenientes do governo local — foi decidida após uma licitação em que as outras duas empresas proponentes também ofereceram ônibus fabricados na China (das marcas Yutong e Zhongtong Bus).
Em Cali, um primeiro grupo de 26 veículos elétricos fabricados pela empresa chinesa Sunwin Bus Corporation começou a rodar em setembro. A terceira maior cidade colombiana estabeleceu a meta de introduzir ao todo 125 ônibus elétricos no sistema de transporte MIO este ano.
Medellín e Cali são — assim como contou o Diálogo Chino nesta reportagem — as primeiras cidades que avançam na meta assumida como um compromisso pela Colômbia no Acordo de Paris, de substituir 75% dos ônibus públicos em sete cidades para veículos que não emitem gases poluentes até 2040. As cidades passaram na frente de Bogotá, que teve maiores dificuldades, já que na China já existe um mercado sólido de ônibus elétricos comuns, como os comprados por Medellín e Cali, mas não de articulados e biarticulados, como os exigidos pelo sistema de TransMilenio na capital.
A tecnologia elétrica tem uma atração adicional para a Colômbia: dado que 70% da eletricidade do país vem de usinas hidrelétricas, a Colômbia possui uma matriz energética muito mais limpa do que a da maioria dos países e, portanto, os ônibus contribuem para um modelo de energia ainda mais verde.
Uma estrada para o sul
Em novembro, o presidente Iván Duque anunciou que outra empresa chinesa foi escolhida para terminar uma estrada no sul do país que enfrentou todo tipo de problemas.
Esta é a estrada de 456 quilômetros entre as cidades de Neiva e Mocoa, que faz parte do ambicioso plano de estradas de “quarta geração” ou 4G lançado pelo ex-presidente Juan Manuel Santos. Essa rodovia é fundamental porque integraria ao resto do país à região de Putumayo, na fronteira com o Equador, que historicamente teve muitos problemas de acesso aos mercados e continua sendo um dos epicentros do cultivo de coca.
A construtora da estrada será a CCA Colombia Corp, uma subsidiária da China Construction America. Essa empresa, por sua vez, faz parte da gigante estatal China State Construction Engineering Corporation (Cscec), que ocupa a 21ª posição na lista das maiores empresas da Fortune.
Embora deva estar pronta até o final de 2019, a construção da estrada está paralisada e só avançou 5% até agora, porque as Aliadas — o consórcio que venceu a licitação em 2015 — declararam falência. Isso aconteceu depois que o seu principal sócio, o construtor Carlos Solarte, se envolveu no escândalo de corrupção em torno da multinacional brasileira Odebrecht.
No entanto, quase um mês após o anúncio — como disse La Silla Vacía — ainda não há na Agência Nacional de Infraestrutura (ANI) nenhum documento confirmando que a construtora chinesa assumirá as obras, nem tampouco a certeza de que estas serão retomadas em breve.
Esses anúncios parecem mostrar que, como o presidente colombiano, Iván Duque, disse em sua visita de Estado a Pequim e Xangai em agosto, a Colômbia quer desenvolver um relacionamento com a China que vá além de suas vendas milionárias de petróleo.