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Embaixadores chineses na América Latina marcam presença no Twitter

Depois de enfrentarem acusações sobre a Covid-19, diplomatas defendem a China online e buscam apresentar uma imagem mais moderna do país
<p>Embaixador chinês no México Zhu Qingqiao posa para fotos de grupo com seguidores no Facebook do Centro Cultural da China no México (Imagem: Alamy)</p>

Embaixador chinês no México Zhu Qingqiao posa para fotos de grupo com seguidores no Facebook do Centro Cultural da China no México (Imagem: Alamy)

A pandemia de Covid-19 – e os esforços para apontar os culpados, tanto pelas causas como pelas respostas inadequadas – acelerou um movimento que já vinha acontecendo na América Latina e no mundo: os embaixadores chineses estão marcando presença e sendo mais assertivos nas redes sociais e nas mídias tradicionais.

Na América Latina, o exemplo mais evidente acontece no Brasil. Em abril, depois dos tuítes de Eduardo Bolsonaro – filho do presidente que atua como conselheiro de Política Externa – alegando que a disseminação do vírus tinha sido “culpa da China”, os diplomatas chineses acusaram-no de estar “jogando gasolina na fogueira da xenofobia” e de estar sofrendo uma “lavagem cerebral por parte dos Estados Unidos”.

A quarentena tem sido uma oportunidade para diversos diplomatas se aventurarem pelos cadernos de opinião dos jornais latino-americanos. Os embaixadores chineses no México e no Peru, por exemplo, publicaram artigos com títulos como “Juntos venceremos a pandemia” e “Uma reflexão sobre o futuro da humanidade”. Os escritos de Xu Bu, embaixador no Chile, tiveram um título um pouco mais direto: “Pompeo, o mentiroso”.

O estilo, bem como a substância, das robustas tentativas de autodefesa da China chamaram a atenção da imprensa nacional. Oliver Stuenkel, professor de relações internacionais na Fundação Getúlio Vargas em São Paulo, postou o seguinte tuíte depois de assistir a uma entrevista com um diplomata chinês em horário nobre na TV brasileira: “A nova geração de diplomatas deixou de ser formada por burocratas sem rosto. Agora, eles são mais jovens, acessíveis e falam um português impecável”.

Wei Quiang, embaixador da China no Panamá, disse ao Diálogo Chino que o aumento da visibilidade dos diplomatas chineses na mídia latino-americana é resultado da importância crescente do país na região e do crescimento das redes sociais. “Eu trabalho na América Latina há mais de 30 anos e, segundo a minha experiência, nós sempre quisemos aparecer na mídia e engajar o público, mas não havia muita atenção nesse sentido”, afirma ele. “Agora, a China está reagindo às demandas para que ocupe um papel de maior destaque no mundo. É verdade que os nossos diplomatas ganharam visibilidade, mas isso é devido a uma mudança das circunstâncias e não a uma nova estratégia.”

Com 13 mil tuítes e 15,4 mil seguidores, Wei é o usuário de Beijing mais ativo nas redes sociais da América Latina. As embaixadas chinesas têm contas oficiais no Twitter há muitos anos, mas o crescimento das contas pessoais é um fenômeno relativamente recente. Uma história da BBC identificou 33 contas pessoais de diplomatas em todo o mundo, sendo 19 delas criadas em 2019.

Quatro dessas contas tinham origem na América Latina. Uma pertence a Yang Wanming, embaixador em Brasília. Três outras pertencem a diplomatas em El Salvador, Panamá e na República Dominicana, os três países que estabeleceram relações formais com Beijing depois de cortarem laços com Taiwan em 2017 e 2018.

Em novembro do ano passado, Lijan Zhao, vice-diretor de relações exteriores, destacou os tuítes em espanhol de Wei, afirmando que “a presença dos embaixadores chineses no Twitter é uma tendência inevitável. Eles vão falar sobre uma China de verdade e farão a voz do país ser ouvida”.

“O Twitter pode ser complexo e tóxico, mas é uma excelente ferramenta educacional”, disse Wei. “Foi através dele que aprendi rapidamente sobre a cultura panamenha, entendi o que faz a vida aqui pulsar e apresentei uma imagem mais objetiva da China moderna, desafiando aquela imagem antiquada do país que muitos aqui ainda mantêm”.

Wei foi apontado para o cargo em outubro de 2017, três meses antes de John Feeley apresentar a sua carta de demissão como embaixador dos EUA devido às diferenças com a administração de Trump. Até o momento, o Departamento de Estado não providenciou um substituto para Feeley, que é um prolífico usuário do Twitter e também uma celebridade local. Na sua ausência, Wei se tornou o embaixador com o maior número de seguidores no país e, a julgar por suas fotos e aparições públicas, um membro popular da comunidade internacional.

O ‘soft power’ da China não está funcionando

Assim como outros diplomatas chineses online, Wei vem usando a plataforma para compartilhar evidências de especialistas internacionais que desafiam as teorias de que a Covid-19 tenha sido criada pelo homem, ou de que a China seja culpada por disseminar a doença.

“Os Estados Unidos, no momento, não têm desempenhado um papel positivo. O país tem criticado a China sem motivos para isso”, disse ele. “Para nós, o ideal seria um relacionamento tripartido (Estados Unidos-China-Panamá) que beneficiasse a todos, mas, se isso não é possível, então que os caminhos [dos Estados Unidos e da China] sejam paralelos em vez de se chocarem de forma negativa”.

Wei disse que recebeu poder discricionário dos seus superiores para postar o que quiser. Alguns observadores chineses notaram que houve uma grande mudança no comportamento diplomático, o que aponta para mudanças nas políticas centrais. Um claro exemplo disso seriam as críticas diretas feitas ao governo brasileiro.

“Nos últimos anos, constatamos uma mudança na forma como a China apresenta a sua imagem, com uma ênfase muito maior na diplomacia cultural”, contou Alessandra Cappelletti, professora de relações internacionais na Universidade Xi’an Jiaotong-Liverpool, ao Diálogo Chino. “No entanto, intrometer-se nos assuntos de outro país é algo muito recente. O respeito pelos governos locais, independentemente da natureza deles, sempre foi um pilar da política externa chinesa”.

Apesar disso, para o governo chinês, a pandemia de Covid-19 causa um problema de imagem que é sem precedentes.

“O ‘soft power’ da China não está funcionando, apesar dos enormes investimentos que recebeu”, explica Cappelletti. “A expansão da presença chinesa online significa que os diplomatas estão expostos às críticas de um público bem informado e curioso. O coronavírus acabou com algo que levou muitos anos e muito trabalho duro para construir. O desafio agora será reconstruir a credibilidade do país.”