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Metrô de Bogotá: após contratempos, começa obra de mobilidade urbana

Capital colombiana quer há décadas um metrô, mas pandemia e protestos em massa impulsionaram outras questões para cima da agenda. Com o início dos trabalhos, os desafios permanecem
<p>Moradores de Bogotá esperam por um ônibus no sistema de trânsito rápido da cidade. A capital colombiana é uma das cidades mais congestionadas do mundo, mas finalmente começam as obras do tão esperado Metrô de Bogotá, juntamente com uma série de iniciativas de mobilidade urbana que podem trazer alívio aos cidadãos. (Imagem: Gabriel L. Guerrero / Alamy)</p>

Moradores de Bogotá esperam por um ônibus no sistema de trânsito rápido da cidade. A capital colombiana é uma das cidades mais congestionadas do mundo, mas finalmente começam as obras do tão esperado Metrô de Bogotá, juntamente com uma série de iniciativas de mobilidade urbana que podem trazer alívio aos cidadãos. (Imagem: Gabriel L. Guerrero / Alamy)

Já na década de 1940, Bogotá sonhava em ter um sistema de metrô, como testemunham os jornais da época. Quase 80 anos mais tarde, as esperanças de melhorar a mobilidade urbana na congestionada capital colombiana finalmente parecem estar se concretizando.

Em 27 de novembro de 2019, a Empresa Metro de Bogotá (EMB) e um consórcio chinês composto pela China Harbour Engineering Company Limited (CHEC) e o sócio minoritário Xi’an Metro Company Limited assinaram um contrato para iniciar a construção da Linha 1 do Metrô. Era um avanço há muito esperado para uma cidade de mais de 11 milhões de habitantes e a quinta mais populosa da América Latina. 

No entanto, o progresso desde então não foi tranquilo, pois a pandemia da Covid-19 e uma prolongada onda de protestos tomou conta da Colômbia e paralisou a construção na capital. No final de 2021, no entanto, as obras de demolição e inauguração do metrô finalmente começaram, com a Linha 1 agora projetada para começar a funcionar em 2028. 

O alívio muito necessário para o sistema de transporte da cidade está no horizonte, mas ainda pode haver um caminho tortuoso pela frente, pois as reclamações e preocupações de cidadãos e políticos continuam.

Menos trânsito em Bogotá

Os moradores de Bogotá passam em média 52 minutos viajando para o trabalho ou para a escola todos os dias, de acordo com Numbeo, um banco de dados global de indicadores de qualidade de vida em diferentes cidades. A viagem de ida e volta diária de quase duas horas, desacelerada por engarrafamentos e semáforos, coloca a cidade sul-americana no topo do ranking onde as pessoas passam mais tempo se locomovendo.

Em 2020, a consultoria de análise de transportes Inrix classificou novamente Bogotá como a pior cidade do mundo para o tráfego de automóvel, com base em dados de antes da pandemia. De acordo com suas pesquisas, em 2019, os residentes de Bogotá perderam, em média, 191 horas no trânsito. A necessidade de melhores alternativas de transporte público não poderia ser mais evidente.

Modelo do projeto do metrô de Bogotá
Estima-se que até 2030 o metrô permita uma redução de 547 milhões de quilômetros por ano no transporte público e privado da cidade. (Imagem: Gabinete do Prefeito de Bogotá)

No final de dezembro, para combater o caos do transporte que os bogotanos enfrentam, a prefeita da cidade, Claudia López Hernández, assinou um decreto de “emergência”, pedindo um novo plano de uso do solo para a capital. Isto visa melhorar o transporte público, tornar a cidade mais verde e inclusiva, melhorar a habitação, entre outros objetivos.

O novo plano também prevê várias obras públicas que podem melhorar a mobilidade em Bogotá entre 2022-2035, incluindo novas linhas de bonde, pistas de alta velocidade, teleféricos e, mais notadamente, a primeira linha do metrô. É o maior projeto de infraestrutura do país e deve custar 13 trilhões de pesos colombianos (R$ 17,6 bilhões). 

Enquanto isso, iniciativas introduzidas por López em resposta à pandemia ganharam recentemente o Prêmio de Transporte Sustentável do Instituto para Políticas de Transporte e Desenvolvimento de Bogotá, reconhecendo a implementação de rotas de ciclo temporário, a introdução de 1.485 ônibus elétricos e incentivos de compartilhamento de carros.

As redes de transporte da Colômbia poderiam se beneficiar ainda mais dos investimentos estrangeiros catalisados pelo esquema B3W do G7, plano embrionário de infraestrutura dos EUA, alternativo à Iniciativa de Cinturão e Rota (BRI, em inglês) da China, a qual a nação latino-americana endossou no ano passado. 

Em setembro de 2021, a ministra dos transportes da Colômbia, Ángela María Orozco, se reuniu com o assessor de segurança nacional adjunto dos EUA, Daleep Singh, e com o diretor de operações da Corporação Financeira de Desenvolvimento dos EUA (DFC), David Marchick, para explorar a cooperação em projetos de infraestrutura.

No entanto, a mobilidade urbana é apenas uma das questões sociais urgentes de Bogotá, e desde o início da construção do metrô, outras têm subido na agenda. Em uma cidade acostumada a esperar, moradores tiveram que novamente ter paciência.

Metrô em andamento

Assim como o início da pandemia interrompeu o processo pouco depois da assinatura do contrato, protestos sem precedentes contra as reformas fiscais propostas pelo governo do presidente Iván Duque irromperam em abril de 2021. As manifestações persistiram por meses, depois de evoluir para demandas mais amplas para combater a longínqua desigualdade, paralisando todo o país e atrasando ainda mais qualquer tentativa de reiniciar os trabalhos no metrô.

Apesar da agitação social, as obras começaram em agosto, com a inauguração de um pátio que acomodará os 30 trens da primeira linha de metrô. No mês seguinte, o solo foi escavado para a linha em si. Ela está prevista para se estender por um total de 24 quilômetros e transportar até 72 mil passageiros por hora, em ambas as direções. 

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quilômetros será a extensão da Linha 1

A EMB anunciou em fevereiro que a construção do pátio do trem está 16% concluída e sugeriu que eles cumprirão as datas de entrega antes do prazo. A prefeita López saudou o anúncio no Twitter.

Além de aliviar os problemas de congestionamento da cidade, o metrô de Bogotá também deve estimular a economia colombiana, através da geração de empregos e da promoção de cadeias nacionais de produção de aço e cimento, segundo José Stalin Rojas, diretor do Observatório de Logística, Mobilidade e Território da Universidade Nacional da Colômbia. 

Hoje, de acordo com a revista Semana, já existem 253 empresas registradas como subcontratadas e fornecedoras em um portal administrado pela Metro Línea 1 SAS, a empresa criada pelos sócios do consórcio chinês. Dessas empresas, 190 são locais e se beneficiam das obras, enquanto ainda serão criados 17 mil empregos diretos e indiretos. 

A reportagem da Semana acrescenta que na construção serão criados 370 empregos indiretos em 2022. A construção do intercâmbio da linha na Calle 72 e na Avenida Caracas — local do início da construção em setembro — continuará até 2022 e criará 130 empregos indiretos.

Embora as coisas pareçam ter começado positivamente, nem todos concordam.

Reclamação mais recente a metrô

No mesmo dia em que a EMB anunciou seu ritmo de progresso, o candidato ao Senado Hollman Morris apresentou uma queixa criminal contra a prefeita López e o ex-prefeito de Bogotá — e candidato à presidência — Enrique Peñalosa, que ocupava o cargo quando a concessão foi concedida, por supostas irregularidades na contratação. 

“A prefeita deve uma explicação ao povo de Bogotá”, disse Morris. “Seis bilhões de pesos (R$ 8,1 milhões) [foram] para esses dois consórcios, Garrigues e KPMG, ilegalmente, sem justificativa. Seis bilhões de pesos de impostos colombianos foram pagos pela empresa Metro de Bogotá, sem estudos prévios e que não foram incluídos no contrato”. 

Peñalosa respondeu às denúncias de Morris via Twitter, dizendo que era um aliado “típico” de Gustavo Petro — outro ex-prefeito de Bogotá e atual candidato à presidência — no sentido de que ele “só fala, não é rigoroso, não estuda, não entende e, é claro, não faz nada”, acrescentando: “o que é certo é que Petro não fez nada, mas nós contratamos o metrô”.

Em resposta, López rejeitou quaisquer alegações de irregularidades, descrevendo-as apenas como “pontos de melhoria”. Ela disse a uma estação de rádio local que os bogotanos deveriam “ficar tranquilos” e que ela resolveria a questão, antes de atacar seus rivais: “Para eles, o metrô elevado é corrupto porque não é deles”.

Dúvidas de cidadãos de Bogotá

Além de supostas irregularidades financeiras, a construção do metrô também está afetando a qualidade de vida de alguns, afirmou ao Diálogo Chino Fabio Prieto, membro do grupo comunitário Vecinos del Metro (Vizinhos do Metrô), criado para monitorar os impactos do projeto. Ele disse que os moradores da cidade não estão sendo devidamente consultados. 

“Quando você vai [à EMB] e pergunta algo, eles sempre dizem ‘não, isso é privado’. Então, por que eles fazem um exercício de participação cidadã? É muito cansativo”, disse Prieto, irritado com o sigilo da empresa. O Diálogo Chino tentou contato com a empresa para obter informações além do que está disponível em seu site, mas ela não respondeu. 

Prieto afirma que, em Santa Isabel, um dos bairros do sul de Bogotá por onde passará a primeira linha de metrô, a empresa deu à comunidade informações imprecisas. 

“Há cinco meses, eles nos informaram que iriam demolir 59 casas. Há um ano, em 2020, [temos um registro] de que eles disseram que iriam demolir 50 ou 90 cm dos jardins da frente”, disse Prieto. Em 23 de junho de 2021, após três anos sem declarar a extensão das demolições, houve sugestões de que “metade de um bairro” poderia ser afetado. Os residentes continuam a viver com incerteza.

Em agosto, moradores de Santa Isabel foram informados de que 59 casas seriam demolidas, disse Prieto, citando um documento do governo local divulgado na época. Em 2020, Prieto acrescentou, eles foram informados de que o trabalho só invadiria “50 ou 90 cm” nos jardins da frente das propriedades afetadas. Mas os moradores estão céticos e afirmam que a EMB não declarou a extensão total das demolições, com alguns sugerindo que “metade do bairro” pode ser afetado, segundo Prieto.

O Diálogo Chino tentou contato com a empresa para esclarecimentos sobre este assunto, mas até a publicação, nenhuma resposta foi recebida.

Omar Oróstegui, cientista político e ex-diretor da organização Bogotá Cómo Vamos, diz que “o processo já está muito avançado, portanto, isto não deve ser uma preocupação”.

“A primeira etapa foi a negociação do terreno, agora resta muito pouco para se adquirir. Como se trata de um metrô elevado, poucas áreas de intervenção são realmente necessárias”, disse ao Diálogo Chino, acrescentando que espera que esses conflitos possam ser resolvidos.

Segunda linha de metrô está chegando

Apesar das reclamações, o governo e o gabinete da prefeita de Bogotá anunciaram a construção da segunda linha de metrô em junho de 2021. Essa seção será subterrânea e se destina a beneficiar mais de 2,5 milhões de habitantes. Custará 13 bilhões de pesos, se estenderá por 15,8 quilômetros e terá 11 estações. De acordo com a EMB, estará operacional em 2030.

Em dois anos, nós fizemos para a segunda linha o que levou dez anos [para fazer] para a primeira

“A segunda linha do metrô de Bogotá será estruturada e financiada durante o governo de Iván Duque. Em dois anos, nós fizemos para a segunda linha o que levou dez anos [para fazer] para a primeira”, afirmou López.

Segundo declaração da EMB, como parte do contrato entre a empresa e a Financiera de Desarrollo Nacional, agência que promove a participação do setor privado nas obras públicas, as explorações geotécnicas da linha começaram em 21 de dezembro de 2021. Por enquanto, não foram anunciados mais progressos nas obras. 

O que se sabe é que a rede consistirá de 26 trens e transportará até 60 mil passageiros por hora em cada direção, alimentando as esperanças de bogotanos de que o fim de sua longa espera coletiva esteja finalmente no horizonte.