Com a aprovação no Senado do Chile em 11 de outubro, a Parceria Trans-Pacífica está próxima de ser ratificada, após mais de quatro anos de discussões e atrasos. O avanço do acordo comercial ocorre apesar da resistência de movimentos sociais e de uma cisão na coalizão que apoia o presidente Gabriel Boric.
O Acordo Abrangente e Progressivo da Parceria Trans-Pacífica, conhecido como TPP11, é um acordo entre 11 países da Ásia e regiões do Pacífico: Austrália, Brunei, Canadá, Chile, Malásia, México, Japão, Nova Zelândia, Peru, Cingapura e Vietnã. Com suas economias representando juntas 13% do PIB global, muitos governos participantes o vêem como o acordo comercial mais importante da região.
O que é TPP11?
É um tratado de integração econômica plurilateral na região Ásia-Pacífico envolvendo 11 países: Austrália, Brunei, Canadá, Chile, Malásia, México, Japão, Nova Zelândia, Peru, Cingapura e Vietnã.
Os objetivos do TPP11, segundo o site oficial do governo chileno, incluem a integração econômica, estabelecendo estruturas legais para o comércio, facilitando o comércio regional e promovendo o crescimento sustentável, entre outras metas.
A relação do Chile com o acordo começou com a Parceria Trans-Pacífica (TPP) original, um agrupamento que contava com os 11 signatários do tratado atual mais os Estados Unidos, mas que não se concretizou por que Donald Trump retirou o país da parceria ao assumir a presidência em 2017.
Um novo acordo foi posteriormente promovido, um processo no qual o governo chileno participou ativamente. As propostas da nova parceria foram semelhantes às originais, mas houve a suspensão de 20 disposições, cuja reativação no futuro não está descartada. Somente Chile e Brunei ainda não ratificaram o acordo.
TPP11: Atraso na aprovação, rejeição pública
Embora o Chile já tenha acordos comerciais bilaterais com os dez outros países que compõem o tratado, ele tem sido uma força motriz por trás do TPP11 desde o governo da ex-presidente Michelle Bachelet (2006-10, 2014-18). O novo acordo foi assinado em março de 2018 pelo então ministro das Relações Exteriores, Heraldo Muñoz, pouco antes do fim do mandato de Bachelet.
Em seguida, foi necessária a aprovação do Congresso chileno para a ratificação. Este processo levou mais de quatro anos, sendo aprovado na Câmara dos Deputados em 2019, no segundo governo de Sebastián Piñera (2010-14, 2018-22), e agora confirmado pelo Senado, no mandato do atual presidente Gabriel Boric.
Boric tinha sido um dos principais opositores do acordo enquanto estava no Congresso, portanto a aprovação durante seu governo — apesar das ferramentas legais a seu favor para impedi-lo — foi criticada, mesmo dentro do partido governista.
O presidente disse que cumprirá a decisão de ambas as casas do Congresso, apesar de indicar sua contínua oposição pessoal. “Votei contra esse tratado quando eu era deputado, portanto, o resultado final que saiu não é aquele que eu gostaria”, disse em uma coletiva de imprensa após o resultado.
“Respeito profundamente os poderes do Congresso e a vontade democrática que se expressa nele, independentemente do fato de que às vezes eu possa não gostar das decisões. Portanto, tenho o dever de fazer cumpri-la”, acrescentou o presidente.
Daniel Jadue, ex-candidato presidencial do Partido Comunista e atual prefeito do município de Recoleta, disse que o papel do governo na ratificação do TPP11 poderia gerar uma ruptura política no partido governista.
“É claramente uma renúncia a seu programa e às promessas feitas aos eleitores de nosso país. Esta é uma parte do programa que é imposta pelas forças políticas que chegaram após o segundo turno das eleições presidenciais”, disse ele. Em 2021, Jadue perdeu para Boric nas primárias da candidatura presidencial da coalizão de esquerda Apruebo Dignidad, mas seu partido continuou fazendo parte da aliança governamental.
Como Jadue destaca, o programa presidencial de Boric tomou uma posição clara sobre os acordos comerciais: “Enquanto todos os processos de participação dos cidadãos, governos locais e regionais e povos nativos não tiverem sido revistos, bem como os parâmetros dos princípios feministas, verdes e descentralizadores, nenhum novo acordo comercial será assinado, incluindo o TPP11”.
O problema para Boric é que tais processos de participação não aconteceram em relação ao TPP11, de acordo com organizações ambientais e sociais, que rejeitam o acordo.
Um desses grupos é o Movimiento por el Agua y los Territorios. Nas palavras de sua porta-voz, Francisca Fernández, sua organização rejeita o acordo por vários motivos: “Os acordos de livre comércio são feitos à custa dos territórios, pois dentro da dinâmica da economia mundial, as economias menores e não industrializadas estão em desvantagem em relação às grandes economias”.
“Isto afeta a natureza, por exemplo, incentivando projetos extrativistas. Quando o TPP11 for ratificado em um país onde a água é privatizada, será quase impossível reverter esta situação sem recorrer a tribunais”, concluiu Fernández.
Isto afeta a natureza, incentivando projetos extrativistas. Em um país onde a água é privatizada, será quase impossível reverter esta situação sem recorrer a tribunais
Por sua vez, a cientista política Pamela Poo atribui a oposição das organizações sociais ao sistema econômico que se desenvolveu no Chile. “A rejeição se baseia na lógica das atividades que nosso país promove, que é a venda de matérias-primas e alguns derivados, gerando dependência e nos expondo aos altos e baixos da economia global, além de gerar graves consequências em diferentes territórios, em termos de destruição de ecossistemas”, disse ela.
Entre os pontos que geraram mais debate está o Capítulo 9 do texto do acordo, especificamente a seção B, sobre disputas investidores-estado. Esta seção considera a possibilidade de solicitar a arbitragem por empresas investidoras que decidam processar os Estados por descumprimento do TPP11.
O que é mencionado neste capítulo traz mais complexidade, “já que os Estados estão sendo cada vez mais desafiados pelas corporações transnacionais sobre suas decisões”, disse Pamela Poo.
Aguardando cartas bilaterais do acordo
Após aprovação no Senado, o TPP11 agora requer apenas a assinatura do presidente Boric para ratificação e implementação, o que tornaria o Chile o décimo país a ratificar o acordo.
Diante desta situação, o Executivo disse que aguardará a conclusão das “cartas de acompanhamento” que estão sendo negociadas. Essas cartas são acordos regulatórios específicos elaborados bilateralmente entre os Estados participantes e consideram salvaguardas e exceções ao tratado.
Para o ex-ministro da Agricultura, Carlos Mladinic, o TPP11 seria benéfico para o Chile: “Não vejo nenhuma dificuldade significativa para a aprovação do tratado. Em termos de solução de controvérsias investidor-estado, este texto é muito mais preciso do que aqueles em vigor nos tratados bilaterais”.
Mladinic acrescentou que um dos objetivos das cartas bilaterais é deixar intocados os artigos sobre solução de controvérsias. “Se aceitos, então os tratados bilaterais, que são de qualidade inferior, continuariam a se aplicar”, disse.
Em termos de solução de controvérsias investidor-estado, este texto é muito mais preciso do que aqueles em vigor nos tratados bilaterais
De acordo com as últimas declarações do Executivo, as respostas às cartas bilaterais devem ser recebidas dentro dos próximos meses. Espera-se então que o presidente Boric assine o acordo.
O avanço do TPP11 através do Senado pode apresentar outro obstáculo para uma presidência cada vez mais difícil para Boric, cujos índices de aprovação continuam a cair desde que assumiu o poder em março. O TPP 11 pode significar o início de uma separação por partidos da coalizão, como o Partido Comunista, e mais problemas para Boric.