Oceanos

As águas da Antártida vão receber novas proteções?

Países discutem até a próxima semana a ampliação de áreas marinhas protegidas no oceano glacial
<p>Baleias-jubarte no Canal Errera, Antárctida. As nações vão votar este mês sobre a ampliação da proteção do Oceano Sul ao redor da Antártica e a gestão da pesca do krill na área (Imagem © Abbie Trayler-Smith / Greenpeace)</p>

Baleias-jubarte no Canal Errera, Antárctida. As nações vão votar este mês sobre a ampliação da proteção do Oceano Sul ao redor da Antártica e a gestão da pesca do krill na área (Imagem © Abbie Trayler-Smith / Greenpeace)

Vinte e cinco países e a União Europeia (UE) se reúnem até o dia 25 de outubro para votar sobre a extensão da proteção do oceano glacial da Antártida e como regular a pesca de krill, pequenos crustáceos semelhantes a camarões.

A pesca na região é regulada pela Comissão para a Conservação da Fauna e da Flora Marinhas da Antártida (CCAMLR). Em 2002, a comissão concordou em criar uma rede de áreas marinhas protegidas (AMPs). Em 2009, seus membros deram o primeiro grande passo oficializando uma AMP para cobrir 94 mil quilômetros quadrados abaixo das Ilhas Orkney, no sul da Antártida. Em 2016, a CCAMLR negociou a criação do maior “parque marinho” do mundo, cobrindo 1,55 milhão de quilômetros quadrados no Mar de Ross, ao sul do continente (ao contrário de uma AMP permanente, o estatuto desse parque terá de ser renovado após 35 anos).

Observadores e especialistas esperam que a reunião aproveite o impulso criado pelas próximas reuniões da COP15 sobre a biodiversidade e da COP26 sobre mudanças climáticas. Ainda assim, eles reconhecem que as diferenças entre os países, particularmente China e Rússia, podem dificultar a obtenção de consenso.

Dois pingüins em um corpo de gelo
 As águas antárticas estão mudando rapidamente. Uma das grandes questões é como a biodiversidade marinha irá responder aos eventos climáticos e à pesca (Imagem: Torsten Dederichs / Unsplash )

“As duas grandes crises no planeta são a biodiversidade e o clima, e o único lugar para tomar medidas concretas sobre ambas é na CCAMLR. É aqui que temos que mostrar que estamos falando sério”, disse Andrea Kavanagh, diretora de Antártida e Oceano Austral na organização The Pew Charitable Trusts. “O fato de que será uma reunião híbrida (online e presencial) torna as decisões finais muito difíceis”.

Propostas para o oceano da Antártida

três propostas de AMP em discussão. A primeira veria três blocos de oceano protegidos ao longo da Antártica Oriental, uma área rica em corais e presas de pinguins. Embora a proposta tenha sido discutida sem sucesso por nove anos consecutivos, os especialistas concordam que ela tem agora sua melhor chance de avançar.

Outra proposta é de uma nova AMP de 1,8 milhão de quilômetros quadrados ao norte do continente, no Mar de Weddell. Ela foi apresentada em 2018 pela UE e recebeu o apoio de outros membros. Seria, se fosse criada, a maior reserva natural do mundo.

A terceira proposta foi apresentada em 2017 por Argentina e Chile. Ela veria uma AMP a oeste da península da Antártida, uma área particularmente vulnerável aos impactos de turismo, pesca e mudanças climáticas. Até três quartos de krill da Antártida estão lá.

Discursando no recente aniversário da assinatura do Protocolo sobre a Proteção Ambiental do Tratado Antártico, de 1991, que impede a mineração na Antártida, John Kerry, enviado especial dos EUA para o clima, disse esperar que a diplomacia internacional esteja madura o suficiente para criar novas AMPs este ano. “Se conseguirmos o apoio de China e Rússia, muitos outros se juntarão”, acrescentou ele.

Você sabia?


O oceano da Antártida compreende aproximadamente 10% do oceano mundial e abriga alguns dos ecossistemas mais vulneráveis e importantes do globo

Os dois países têm hesitado na criação de novas AMPs. Ainda assim, um forte esforço diplomático poderia mudar isso, como aconteceu com a AMP do Mar de Ross, disse Nengye Liu, professora da Faculdade de Direito de Macquarie, na Austrália.

Geneviève Pons, co-diretora da Antártida 2020, um grupo de campanha pela proteção do Oceano Sul, fez coro. Ela acrescentou que 18 dos 26 membros da CCAMLR concordaram formalmente em patrocinar pelo menos uma das três propostas da AMP.

O oceano da Antártida compreende aproximadamente 10% do oceano mundial e abriga alguns dos ecossistemas mais vulneráveis e importantes do globo. Milhões de pinguins, aves marinhas, peixes, focas, baleias e krills vivem na região e precisam de mais proteção.

Especialistas concordam que as AMPs são a melhor forma de garantir isso. Não avançar com as três propostas sobre a mesa poderia ter consequências desastrosas para os ecossistemas da Antártida. A situação é especialmente importante dado que se espera que o Protocolo do Tratado da Antártida seja revisto depois de 2048.

Krill, o crustáceo glacial

O krill antártico também fará parte da agenda deste ano. A principal medida de conservação do crustáceo, conhecida como CM 51-07, expira este ano. Os países-membros poderão adotar uma nova medida, renovar a atual ou permitir sua pesca não regulamentada.

O krill forma a base da teia alimentar da Antártida, sustentando espécies predadoras como pinguins, focas e baleias azuis. O crustáceo também desempenha um papel na luta contra as mudanças climáticas, alimentando-se de algas que absorvem carbono e jogando os resíduos de carbono no fundo do oceano.

A pesca do krill já está se sobrepondo a áreas de predadores, impactando o sistema alimentar

A pesca de krill no oceano glacial continua a ser uma séria preocupação, reduzindo as quantidades locais disponíveis de krill para predadores naturais. Atualmente, os limites de captura são estabelecidos para áreas específicas. Os principais pescadores de krill são da Noruega, China e Coreia do Sul.

Emily Grilly, gerente do Programa da Antártida pela WWF Austrália, acredita que o CM 51-07 provavelmente será renovado, já que ainda não se chegou a um consenso sobre uma nova medida de conservação.

“A pesca do krill está crescendo a cada ano e se não for regulamentada, seria um grande problema. Ela já está se sobrepondo a áreas de predadores, impactando o sistema alimentar”, afirmou.