O Equador depositou ontem o documento que ratifica o Acordo de Escazú, dando grande impulso para que o pacto entre em vigor. O acordo inovador e sem precedentes na América Latina busca reduzir conflitos sociais e proteger comunidades nas linhas de frente da proteção ambiental na região mais letal do mundo para defensores do meio ambiente.
Aquele anúncio significa que apenas mais dois países precisam ratificar o acordo regional para que ele entre em vigor. O acordo inicialmente foi aberto para assinaturas durante a Assembleia Geral da ONU de setembro de 2018, depois de anos de negociação sob a supervisão da Comissão Econômica da ONU para a América Latina e o Caribe (Eclac).
Treze outros países ainda precisam ratificar o acordo. A conta inclui a Colômbia, que assinou o acordo em dezembro do ano passado, voltando atrás de sua resistência inicial ao pacto depois de protestos e pressão da opinião pública. Como o Diálogo Chino já contou, o documento de ratificação do Equador estava pronto desde fevereiro, mas, por causa da pandemia de Covid-19, ele ainda não havia sido publicado no diário oficial local ou depositado nos Órgãos de Tratados das Nações Unidas, em Nova York.
Entre os problemas mais urgentes enfrentados por países latino-americanos estão a galopante taxa de impunidade para quem pratica crimes contra militantes ambientais, o não cumprimento do direito à consulta prévia das comunidades sobre possíveis impactos de grandes projetos de desenvolvimento, e as dificuldades de acesso à informação sobre questões ambientais.
Este é o ABC do Acordo de Escazú:
Por que o tratado de Escazú é importante?
- Proporciona aos cidadãos maior acesso à informação pública em temas ambientais, inclusive sobre grandes projetos de desenvolvimento
- Promove uma maior participação cidadã em decisões ambientais
- Proporciona maior facilidade de acesso à justiça em temas ambientais
- Propõe prevenir, investigar e punir todos os ataques contra defensores de direitos ambientais. É o primeiro tratado internacional que contempla medidas específicas para protegê-los.
Como vai o Escazú?
Onze dos 33 países da América Latina e do Caribe precisam ratificar o tratado para que o acordo possa entrar em vigor.
Oito países já o ratificaram: Antígua e Barbuda, Bolívia, Equador, Guiana, Nicarágua, Panamá, São Cristóvão e Nevis, São Vicente e Granadinas, e Uruguai.
Outros 13 países já assinaram o acordo, mas ainda precisam ratificá-lo: Argentina, Brasil, Colômbia, Costa Rica, Granada, Guatemala, Haiti, Jamaica, México, Paraguai, Peru, República Dominicana e Santa Lúcia.
Onze países não assinaram o acordo ainda: Bahamas, Barbados, Belize, Chile, Cuba, Dominica, El Salvador, Honduras, Suriname, Trinidade e Tobago, e Venezuela.
Dois países declararam publicamente que assinarão: Colômbia e Chile. No entanto, a Colômbia reviu seu posicionamento em dezembro de 2019 e assinou o acordo.
Por que o Acordo de Escazú é necessário para proteger líderes ambientais?
A América Latina ocupa o vergonhoso primeiro lugar em todos os níveis de risco para defensores ambientais
Segundo o relatório de Michel Forst, relator especial da ONU para ativistas de direitos humanos, apresentado nas Nações Unidas em 2016:
- Os 10 países mais perigosos para defensores ambientais incluem seis da América Latina: Brasil, Colômbia, Guatemala, Honduras, México e Peru
- Das 135 comunicações enviadas por Forst a governos e empresas sobre violência contra defensores ambientais, 48% dizem respeito a casos na região
Segundo o relatório da ONG Global Witness deste ano, 164 defensores ambientais foram assassinados em 2018 em todo o mundo:
- Mais da metade desses assassinatos ocorreram na América Latina, que se tornou a região mais violenta para ativistas ambientais desde que o relatório começou a ser produzido, em 2012.
- Colômbia, Brasil, Guatemala e México figuram no vergonhoso top 6. Também registraram assassinatos Honduras, Venezuela e Chile.
- Pela primeira vez desde 2012, o Brasil não ocupou o primeiro lugar, embora apareça em quarto. Na Guatemala, o número de assassinatos quintuplicou, tornando-se o país mais perigoso para ativistas ambientais, proporcionalmente.
O projeto jornalístico Terra de Resistentes, que reuniu mais de 35 jornalistas de sete países, investigou a situação dos defensores ambientais em Argentina, Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guatemala, Honduras, México, Peru e Venezuela:
- Foram verificados ao menos 2.367 ataques e episódios de violência contra defensores ambientais entre 2009 e 2019, nesses sete países.
- Os alvos de 56% desses ataques pertencem a alguma minoria étnica, demonstrando que os territórios indígenas e afrodescendentes são especialmente vulneráveis a interesses criminais.
- Informações conclusivas sobre sentenças (condenação ou absolvição) foram encontradas em apenas 289 casos (12% do total), mostrando que a justiça é extremamente ineficiente nesse tipo de ataque. Em boa parte dos casos, as sentenças julgaram os autores materiais dos crimes, não os idealizadores.
- Em ao menos 1.325 casos de ataques (56% do total), houve denúncias das vítimas e suas comunidades para autoridades, desde instituições estatais até instâncias internacionais como a Comissão ou a Corte Interamericana de Direitos Humanos.