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Opinião: Setor financeiro deve promover sustentabilidade na mineração

Instituições financeiras podem ajudar a mitigar riscos socioambientais na extração de minerais para a transição energética, escrevem pesquisadoras da Universidade de Boston
<p>Caminhão transporta minério de cobre da mina Zaldívar, região de Antofagasta, norte do Chile. Especialistas destacaram que, sem fortes proteções socioambientais, a corrida por minerais críticos para a transição energética pode deixar marcas em ecossistemas, deslocar comunidades e aprofundar desigualdades (Imagem: <a href="https://flic.kr/p/2oocAQV">Antofagasta Minerals</a>, <a href="https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/2.0/">CC BY NC ND</a>)</p>

Caminhão transporta minério de cobre da mina Zaldívar, região de Antofagasta, norte do Chile. Especialistas destacaram que, sem fortes proteções socioambientais, a corrida por minerais críticos para a transição energética pode deixar marcas em ecossistemas, deslocar comunidades e aprofundar desigualdades (Imagem: Antofagasta Minerals, CC BY NC ND)

Com a meta dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável se aproximando de seu prazo em 2030, a corrida por energia limpa e ação climática impulsiona a demanda por minerais essenciais à transição energética, como lítio, cobre, cobalto e níquel. A busca por minerais críticos abre oportunidades, mas também impõe riscos: sem salvaguardas, pode causar destruição de ecossistemas, deslocamento de comunidades e aumento das desigualdades.

Nesse momento crucial, instituições públicas de fomento ao desenvolvimento e agências de crédito à exportação podem influenciar a forma de extração desses recursos. As decisões vão determinar se a transição energética vai manter os princípios da sustentabilidade ou exacerbar as injustiças de sempre. 

Um novo relatório analisou como essas instituições se envolvem com o setor de minerais críticos. Produzido pelo Centro de Políticas de Desenvolvimento Global da Universidade de Boston, nos EUA, e pelo Centro de Estudos da China e Ásia-Pacífico da Universidade do Pacífico, no Peru, o documento destaca o papel que podem desempenhar para garantir a governança ambiental e social (ESG) e apoiar um processo de transição mais justo e inclusivo. 

Essas instituições financiam projetos por meio de empréstimos, garantias e seguros. Nossa pesquisa mostra que esses atores — de bancos multilaterais, como a Corporação Financeira Internacional (IFC), a agências, como o Banco de Exportação e Importação da China — estão diretamente envolvidos no financiamento da extração de minerais usados na transição energética.

Além de seus investimentos, essas instituições públicas também oferecem suporte técnico e consultivo, ajudando mineradoras a incorporar os princípios de ESG em suas práticas comerciais. Porém, descobrimos que ainda há grandes lacunas entre o potencial desses bancos para melhorar as práticas de sustentabilidade na cadeia dos minerais de transição e aquilo que eles de fato fazem. 

As conclusões de nosso estudo dizem respeito à tomada de decisão dessas instituições públicas em 2025. Os cinco processos descritos a seguir determinarão como esses bancos e agências de crédito podem apoiar uma cadeia de minerais de transição mais sustentável e justa no longo prazo.

1. Finanças verdes da China: indicadores de desempenho

A China é o ator mais ativo no financiamento de minerais críticos, sobretudo por sua grande influência nos fluxos comerciais globais. Nossa pesquisa mostrou que a China foi responsável por 71% das importações globais de minerais de transição em 2023 — aproximadamente metade delas provenientes da América Latina e do Caribe.

As instituições chinesas têm um longo histórico de apoio a empresas chinesas no exterior. Porém, a gestão de riscos socioambientais é menos avançada do que a de outros países.

A transformação verde no setor financeiro da China será fundamental para o desempenho socioambiental no exterior. Um desses avanços será a introdução de indicadores-chave de desempenho para as Diretrizes de Finanças Verdes da China, que devem ser lançadas este ano. 

Esses indicadores devem oferecer mais transparência, garantindo que os investimentos dos bancos de desenvolvimento e das agências de crédito à exportação estejam alinhados aos padrões globais de sustentabilidade.

Máquina extrai carbonato de lítio no Salar de Uyuni, sul da Bolívia
Extração de carbonato de lítio no Salar de Uyuni, sul da Bolívia. Com sua fábrica em La Palca, no departamento de Potosí, a empresa estatal Yacimientos de Litio Bolivianos tem investido na pesquisa e no desenvolvimento de baterias de lítio (Imagem: Secretaría General Iberoamericana, CC BY NC)

2. Corporação Financeira de Desenvolvimento dos EUA

Mais recentemente, instituições de outros países, como a Corporação Financeira de Desenvolvimento dos Estados Unidos, também surgiram como atores importantes no setor dos minerais de transição. Enquanto agência governamental com mandato fixo estabelecido pelo Congresso, a entidade precisa renovar sua autorização de funcionamento periodicamente. O prazo para obter um novo aval expira no fim de 2025, representando uma oportunidade para reforçar os compromissos de gestão de riscos socioambientais. 

Desde sua criação no primeiro governo Trump, a corporação aderiu aos Padrões de Desempenho da IFC sobre Sustentabilidade Socioambiental, que exigem um nível mínimo de gestão de riscos. A manutenção desses compromissos será crucial, sobretudo se forem apoiados por um trabalho de monitoramento independente, bem como por mecanismos de prestação de contas. Considerando que os minerais de transição são prioritários para o órgão americano, os atores envolvidos na renovação de suas funções no Congresso devem defender uma adesão contínua aos padrões de sustentabilidade.

3. IFC: revisão de padrões socioambientais

As instituições públicas de desenvolvimento precisam resistir à pressão contra flexibilizar suas políticas de gestão de riscos socioambientais sob o argumento de agilizar projetos futuros. 

Os Padrões de Desempenho da IFC servem como base para a gestão de riscos ambientais e sociais de muitas dessas instituições públicas nacionais. Porém, esses critérios devem ser revisados este ano, mesmo sem uma avaliação de sua eficácia pelo próprio Escritório de Avaliação Independente da IFC. 

Isso levanta preocupações sobre a possibilidade de que o órgão ceda a pressões externas. Para manter a credibilidade e lisura desse processo, qualquer revisão dos atuais padrões deve se basear em evidências sólidas quanto à sua eficácia na melhoria do desempenho socioambiental. Um processo de revisão rigoroso e independente é essencial para manter esses padrões globais de referência.

Trabalhadora chilena separa cátodos de cobre em uma fábrica de processamento na região de Antofagasta
Trabalhadora chilena separa cátodos de cobre em uma fábrica de processamento na região de Antofagasta. Na última década, o país teve uma das maiores participações nas exportações de minerais de transição em todo o mundo (Imagem: Antofagasta Minerals, CC BY NC ND)

4. Políticas de financiamento do Banco Mundial

Os bancos multilaterais de desenvolvimento, especialmente o Banco Mundial, têm atuado ativamente no apoio político e institucional à governança do setor de mineração em cooperação direta com os governos nacionais. Embora essa ajuda possa ser transformadora para países pobres, apenas alguns poucos países visados por esse tipo de iniciativa estão entre aqueles com setores de minerais de transição em expansão. 

Nossa pesquisa constatou que, entre 2014 e 2023, o Brasil, Chile e Peru foram os países com a maior parcela de exportações de minerais de transição, enquanto Burkina Faso, Níger e Moçambique receberam a maior parcela do apoio de bancos multilaterais de desenvolvimento. Nenhum país fez parte desses dois grupos ao mesmo tempo.

As discussões sobre o plano estratégico do Banco Mundial — amplo processo iniciado em 2022 para revisar e atualizar os objetivos, operações e recursos da instituição — representam uma oportunidade de expandir o financiamento para países em desenvolvimento. Esse apoio financeiro poderia ajudar a capacitar os ministérios de meio ambiente em nações exportadoras de minerais, integrando medidas de sustentabilidade em marcos regulatórios locais. Alinhar esses esforços com plataformas nacionais, como os Relatórios sobre Clima e Desenvolvimento dos Países do próprio Banco Mundial e as Parcerias para Transição Energética Justa do G20, pode contribuir para uma transição mais justa e igualitária. 

Apesar disso, nossa análise mostra que poucos desses relatórios nacionais discutem seriamente as respostas aos riscos socioambientais na extração de minerais de transição: dos 54 relatórios do Banco Mundial, 22 mencionam esses minerais como uma oportunidade; desses, 18 destacam os riscos socioambientais associados a eles; e apenas nove mencionam estratégias para mitigar esses riscos.

5. Rastreabilidade nas cadeias dos minerais de transição

A criação de mecanismos de rastreabilidade é indispensável para aumentar a transparência, reduzir os danos ambientais e garantir boas práticas trabalhistas nas cadeias dos minerais de transição. Sem rastreabilidade, é praticamente impossível aplicar esses padrões socioambientais corretamente.

O desenvolvimento de mecanismos de rastreabilidade é uma questão urgente: uma iniciativa pioneira de rastreabilidade de minerais apresentada pela Colômbia na última cúpula de biodiversidade da ONU, a COP16, será votada na conferência climática deste ano, a COP30. Essa iniciativa precisará de um forte apoio multilateral para avançar.

Ano decisivo para financiamento sustentável

O ano de 2025 terá vários momentos decisivos para os bancos de desenvolvimento e agências de crédito à exportação em relação à sua participação nas cadeias dos minerais de transição. Desde as Diretrizes de Financiamento Verde da China até a revisão dos Padrões de Desempenho da IFC, as escolhas feitas nos próximos meses moldarão o rumo dos esforços de sustentabilidade pelos próximos anos. O fortalecimento dos compromissos políticos com a sustentabilidade em todas as pontas da cadeia da transição energética deve permanecer na vanguarda das discussões sobre financiamento global.

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