Negócios

Os desafios de um acordo comercial entre Peru e China “otimizado”

Negociações para melhorar o acordo de livre comércio Peru-China não conseguiram abordar os impactos da pesca e mineração, ou envolver a sociedade civil
<p>As exportações do Peru para a China consistem predominantemente de metais e farinha de peixe. Negociações para &#8220;otimizar&#8221; um Tratado de Livre Comércio (TLC) de 2008 não consideraram os impactos sociais e ambientais desses setores (imagem: <a href="https://www.flickr.com/photos/mincetur_peru/48126594843/">MINCETUR</a>)</p>

As exportações do Peru para a China consistem predominantemente de metais e farinha de peixe. Negociações para “otimizar” um Tratado de Livre Comércio (TLC) de 2008 não consideraram os impactos sociais e ambientais desses setores (imagem: MINCETUR)

Lima foi sede, em junho, da segunda roda de negociação para a “otimização” do Tratado de Livre Comércio entre Peru e China (TLC Peru-China), como foi chamado o acordo do novo tratado entre os dois países. Seu calendário não será anunciado publicamente até a conclusão final, mas vale lembrar que o primeiro TLC, em 2008, incluiu seis rodadas de negociações ao longo de um ano.

Até agora, as negociações oficiais sobre a “otimização” do TLC China-Peru só mencionam temas relativos ao comércio de serviços, investimentos, procedimentos, regras de origem, propriedade intelectual e comércio eletrônico. Não foram analisados os graves impactos ambientais e sociais nas duas áreas de maior atividade financeira e comercial entre ambos os países, a mineração e a pesca.

95%


das exportações do Peru para a China desde 2008 consistiam de metais, minerais e farinha de peixe

Em conjunto, nos últimos nove anos de existência do TLC, estas atividades representaram 94,9% de um total de 76,835 bilhões de dólares acumulados (83,5% correspondem a minérios, principalmente cobre e 11,4% à farinha de peixe) das exportações totais para a China, segundo cifras oficiais peruanas.

O projeto de mineração de Las Bambas e Marcona e os dados sobre pesca chinesa ilegal no mar peruano reforçam a urgente necessidade de uma análise abrangente dos impactos dos investimentos e do comércio com a China, se a intenção é realmente produzir um TLC “otimizado”.

O relatório do Coletivo sobre Financiamento e Investimentos Chineses, Direitos Humanos e Meio Ambiente (CICDHA), revela que, durante os últimos dois anos, em Las Bambas, projeto operado pela China Mineral and Metals Group (MMG), em sete ocasiões foi declarado estado de emergência, limitando direitos fundamentais como a liberdade de locomoção e associação, com o objetivo de prevenir os bloqueios às estradas, que impediam a saída do minério até os portos de embarque.

Segundo a constituição peruana, o estado de emergência é uma medida de exceção. No entanto, as autoridades o utilizaram regularmente como medida de pressão para controlar as populações locais que bloqueavam as estradas, exigindo o respeito às leis ambientais e o direito à consulta e compensações equitativas por aquisição de terras.

O governo peruano não conseguiu atingir a meta de diversificar suas exportações e obter um aumento substancial de produtos com valor agregado

Até o momento, os conflitos em Las Bambas contabilizam um saldo de quatro mortos. No caso do projeto de mineração em Marcona, a empresa chinesa Shoumgang Hierros do Peru foi penalizada, em várias ocasiões, por infringir a legislação trabalhista peruana por terceirização irregular, pela contratação trabalhista fraudulenta, discriminação salarial, descumprimento de normas de saúde e segurança do trabalho (incluindo um significativo número de acidentes fatais) e demissões em massa.

Quanto à atividade pesqueira, centenas de embarcações chinesas foram detectadas, desde 2014, atraídas principalmente por espécies como a lula-de-barbatana-curta e a anchoveta peruana. Entretanto, em 2015 e 2016, a PRODUCE, entidade governamental encarregada da regulação da produção de pescado, protegeu preventivamente das embarcações chinesas espécies protegidas, como o hipocampo.

A Federação Internacional de Direitos Humanos (FIDH), Peru Equidade, CooperAcción e o CICDHA incentivaram, em abril, o Ministro de Comércio e Turismo do  Peru, Edgar Vásquez, a inserir no TLC Peru-China “medidas que garantam que os projetos de desenvolvimento e infraestrutura planejados para o Peru sejam plenamente compatíveis com os direitos humanos e respeitem o meio ambiente e a sustentabilidade dos recursos naturais”.

O governo peruano não conseguiu atingir, com o primeiro TLC com a China, a meta de diversificar suas exportações e obter um aumento substancial de produtos com valor agregado. Por outro lado, fortaleceu o modelo primário exportador, à custa da natureza e dos direitos das comunidades locais.

A “otimização” do TLC Peru-China deveria ser uma oportunidade para a mudança. A globalização na era da crise climática requer uma nova visão sobre o comércio e o investimento, que priorize a proteção ambiental e as comunidades acima do lucro corporativo.

Algumas vantagens importantes nessa direção admitem que as comissões negociadoras do TLC China-Peru “otimizado” tenham um espaço de participação plena permanente nas organizações não governamentais nas próximas rodas de negociação; que realizem uma avaliação independente e inclusiva sobre os investimentos e comércio com a China, especialmente nos setores de mineração e pesca e incorporem capítulos específicos sobre temas ambientais e direitos humanos no TLC “otimizado”.