Clima

Ambientalistas cobram protagonismo dos oceanos na COP28

Cientistas e ativistas querem que o oceano ocupe um papel de destaque nas decisões da cúpula climática da ONU e nos planos climáticos nacionais
<p>Parque eólico Hollandse Kust Zuid, na porção holandesa no Mar do Norte. A geração de energia renovável offshore é um dos principais mecanismos para reduzir as emissões de gases de efeito estufa (Imagem: Jeffrey Groeneweg / Alamy)</p>

Parque eólico Hollandse Kust Zuid, na porção holandesa no Mar do Norte. A geração de energia renovável offshore é um dos principais mecanismos para reduzir as emissões de gases de efeito estufa (Imagem: Jeffrey Groeneweg / Alamy)

Faltam apenas três semanas para a conferência climática anual da ONU, que desta vez será sediada em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. Líderes mundiais, representantes da sociedade civil e de empresas se reunirão na COP28, entre 30 de novembro e 12 de dezembro, para discutir estratégias para desacelerar as emissões de gases de efeito estufa e, ao mesmo tempo, responder à já devastadora crise climática.

A cúpula será marcada pela conclusão do primeiro Balanço Global de metas climáticas, por meio do qual é avaliado o progresso do Acordo de Paris, firmado em 2015. Mas o mundo está longe de cumprir o objetivo central de limitar o aumento da temperatura global a 1,5 °C até o fim do século, segundo um relatório prévio sobre o balanço. Porém, os governos signatários do acordo ainda têm espaço para acelerar as ações climáticas.

Ambientalistas consideram de extrema importância aproveitar o potencial dos oceanos para oferecer soluções climáticas, como a restauração de manguezais e a geração de eletricidade por meio do movimento das marés.

“Há muito tempo se reconhece o oceano como uma parte fundamental do sistema climático, e qualquer resposta às [mudanças] climáticas deve incluir ações nos oceanos”, defende Courtney Durham, executiva sênior do programa de apoio à conservação da organização americana The Pew Charitable Trusts. “A COP28 e o Balanço Global são um lugar para enfatizar ainda mais a ligação entre o oceano e o clima”.

Desde a COP25 em 2019, promovida como a “COP Azul”, as questões relacionadas aos oceanos aparecem com destaque nas negociações sobre mudanças climáticas da ONU, e a COP28 não deve ser exceção. Cientistas e ativistas esperam que o oceano de fato atraia os holofotes após vários eventos importantes realizados este ano sobre sua saúde.

Oceanos é tema central

O oceano vai fazer parte tanto das discussões principais da COP quanto de seus eventos paralelos. Cada dia da conferência tem um tema central, e o do dia 9 de dezembro será justamente “Natureza, Uso da Terra e Oceanos”. As organizações de conservação marinha também terão seu próprio espaço, o Pavilhão dos Oceanos, com uma agenda repleta de eventos.

A conclusão do Balanço Global é esperada como uma oportunidade para que os países incorporem ações baseadas nos oceanos em suas metas climáticas. “Queremos ver o oceano como um elemento importante na resposta às mudanças climáticas”, diz Pauli Merriman, diretor de política oceânica da WWF.

O processo de avaliação começou em 2021, reunindo informações de cientistas, técnicos, empresários, líderes indígenas e representantes da sociedade civil. Após uma série de rodadas de discussão, um relatório foi publicado em setembro deste ano, destacando o progresso feito desde a COP de Paris em 2015. O documento afirma que, “embora as ações climáticas estejam em andamento, agora é necessário muito mais empenho em todas as frentes” para cumprir as metas de Paris.

Protestos contra gasoduto na Ilha de Rügen
Ativistas do Greenpeace protestam contra um navio que transporta tubulações de gás no Mar Báltico, na costa da Alemanha, em setembro. O gasoduto conectará uma usina de gás natural liquefeito da Ilha de Rügen ao continente, passando por várias áreas marinhas protegidas (Imagem © Greenpeace)

Em Dubai, os delegados produzirão um resumo das principais decisões políticas estabelecidas na COP e querem chegar a um acordo sobre as próximas etapas para manter viva a meta de limitar o aumento da temperatura média global a 1,5 °C até 2100. “O balanço mostra que ainda temos um problema e que as soluções oceânicas oferecem oportunidades interessantes”, avalia Torsten Thiele, especialista em financiamento para a sustentabilidade dos oceanos.

Marine Lecerf, diretora de política internacional da Ocean and Climate Platform, acredita que, o oceano deve aparecer pelo menos no resumo da COP — embora ela defenda apresentá-lo como uma solução para mitigar as emissões e se adaptar aos impactos das mudanças climáticas. “Quando você vê as menções aos oceanos nas decisões da COP, geralmente têm um sentido bastante amplo”, observa Lecerf. Uma redação mais específica, diz ela, poderia orientar os países a adotarem mais ações climáticas baseadas no oceano após a COP.

O Ocean and Climate Change Dialogue, fórum sobre soluções climáticas baseadas no oceano, publicou um relatório em setembro no qual descreve o Balanço Global como uma “oportunidade única” para estabelecer diretrizes com foco no oceano nos planos climáticos nacionais.

Essas ações agora aparecem com mais destaque nos novos planos climáticos dos países (também conhecidos como Contribuições Nacionalmente Determinadas ou NDCs). Das 106 NDCs novas ou atualizadas de países costeiros e insulares, 73% incluem pelo menos uma meta ou política pública voltada para as ações climáticas baseadas nos oceanos, segundo um relatório do World Resources Institute (WRI) publicado no ano passado.

“O oceano e as zonas costeiras são parte essencial da ação global necessária para enfrentar as mudanças climáticas. São peças que não podem ser ignoradas ou esquecidas”, diz Lisa Schindler Murray, diretora de soluções climáticas naturais e carbono azul da Rare, organização sediada nos EUA. “A intenção é que o Balanço Global informe as futuras NDCs, colocando o oceano e as zonas costeiras como pontos críticos”.

Oceano e mudanças climáticas

Cobrindo mais de dois terços da superfície do planeta, os oceanos desempenham um papel fundamental no sistema climático, regulando as transferências de calor e os ciclos de água e carbono, entre outras funções. Desde o início da Revolução Industrial, eles absorveram 23% de todas as emissões de gases de efeito estufa e 90% do calor retido pelas atividades humanas no planeta.

Um estudo do WRI publicado em setembro revelou que, até 2050, as soluções climáticas baseadas nos oceanos podem garantir 35% dos cortes anuais de emissões e da absorção necessária até 2050 para limitar o aumento da temperatura global a 1,5 ºC — uma boa notícia em relação à estimativa anterior, que previa uma proporção de 21%.

Essas soluções incluem a geração de energia renovável baseada nos oceanos, a redução das emissões do setor de transporte marítimo e a restauração de ecossistemas ricos em carbono. No entanto, até o momento, falta financiamento para esses projetos.

O oceano também pode contribuir na adaptação aos impactos das mudanças climáticas. No sexto relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, órgão de ciência climática da ONU, há uma lista de soluções focadas nos oceanos. A função dessas iniciativas seria proteger, restaurar e administrar de forma sustentável os ecossistemas para preparar a natureza e as pessoas aos impactos climáticos — é o caso, por exemplo, da criação de áreas marinhas protegidas.

Ambientalista mede coral em projeto de restauração do recife da Ilha Wasini
Ambientalista mede coral em projeto de restauração do recife da Ilha Wasini, na costa do Quênia, em junho de 2022. Os recifes de coral podem ajudar as comunidades a se adaptarem ao clima extremo, diminuindo a força das ondas (Imagem: Brian Inganga / Alamy)

A cooperação internacional para a proteção dos oceanos tem avançado. Em junho, após mais de 15 anos de discussões, a ONU adotou formalmente o primeiro tratado internacional para proteger os ecossistemas das zonas de alto-mar, vitais para a humanidade. Em agosto, os governos lançaram o novo Fundo Global para a Biodiversidade, que pode ser crucial para se atingir a meta de proteger 30% do oceano até 2030. Em setembro, foi publicado o primeiro rascunho do tratado proposto pela ONU para acabar com a poluição global de plástico.

Ativistas do oceano, no entanto, enfatizam a necessidade de mais ações de proteção. “Os oceanos sempre foram propulsores das ações climáticas. Eles inspiram as pessoas”, diz Remi Parmentier, diretor da consultoria ambiental do Varda Group. “Há coisas boas acontecendo agora sobre o oceano, o apoio aumentou, mas precisamos de mais. Os governos têm de colocar o dinheiro onde realmente importa”.